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[crônica] A TRAGÉDIA DE CAPITÓLIO

 
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Em 8 de janeiro de 2022, uma rocha despencou do paredão do canyon do Lago de Furnas, em Capitólio, matando 10 pessoas. Neste artigo publicado na Folha da Manhã, de Passos (MG), em 28/1/2022, volto ao assunto. 

COLUNA NA FOLHA DA MANHÃ [7]

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Artigo publicado na Folha da Manhã, de Passos (MG) em 27 de novembro de 2020. 

 

COLUNA NA FOLHA DA MANHÃ [5]

 
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Folha da Manhã é o principal jornal da cidade de Passos (MG). Esta coluna é publicada quinzenalmente, às sextas-feiras. Edição de 30de outubro de 2020.

OS LIVROS, O NATAL E O MERCADO

Uma carta aberta do CEO da Editora Companhia das Letras, Luiz Schwarcz, pede que no Natal as pessoas presenteiem com livros, uma forma de combater a profunda crise em que o mercado livreiro está mergulhado. Duas das maiores redes de livrarias do país, a Saraiva e a Cultura, estão em processo de recuperação judicial. A Cultura acumula uma dívida de R$ 285 milhões, enquanto a Saraiva, maior do país, deve R$ 675 milhões. Juntas, devem para as editoras R$ 325 milhões, segundo o Sindicato Nacional de Editores de Livros (Snel). Elas respondem por 40% do faturamento das principais editoras do país, o que revela o tamanho do estrago em cascata. 

A Livraria Cultura, em pouco mais de dez anos, investiu numa expansão irracional por várias capitais do país. Invadindo o mercado como um tanque de guerra sem freios, atropelou e provocou o fechamento de pequenas livrarias, que tinham como foco livros de qualidade e não “livros de mercado”, aqueles que vendem centenas de milhares de exemplares mas não carecem de reedições, pois são lidos (quando são) e depois caem no esquecimento, sem deixar marcas. 

“É impossível concorrer com a Cultura”, me disse Luiza Neiva, que eu poderia chamar de empresária mas prefiro chamar de uma amante dos livros, pouco antes de fechar a sua Café com Letras, simpática livraria de rua de Brasília, palco de leituras, lançamentos, saraus e shows. Com a livraria, encerrou-se também a “fábrica de leitores” que ela mantinha numa sala dedicada a atividades para as crianças. 

Nesse processo de expansão, a Livraria Cultura comprou a Estante Virtual, rede de sebos que sempre atendeu a quem procurava livros mais baratos ou raros. Ao anunciar a compra, em dezembro de 2017, a Cultura já estava em crise – atrasava pagamentos para as editoras há pelo menos dois anos. Tudo isso sem falar na aquisição da Fnac, que na verdade pagou à Cultura para que a empresa assumisse suas dívidas. 

Para um bom leitor, garimpar numa pequena ou média livraria dá resultado melhor que numa gôndola das grandes redes, onde os espaços são vendidos para as editoras e os livros lá expostos têm a obrigação de vender a rodo. As grandes editoras, como a Companhia das Letras, têm que atender a esse mercado tão voraz quanto culturalmente irrelevante. Essa editora, que também passou por um processo de expansão nos últimos anos, publica livros nas mais diversas áreas, entre as quais literatura e, dentro desta, poesia. Mas um texto sobre “análise de originais”, publicado em seu site, avisa: “Livros de poemas não serão aceitos para análise.” É curioso: a editora publica livros de poesia, mas não recusa-se a receber originais. 

Brasília possui duas lojas da Livraria Cultura. A primeira, no Shopping Casa Park, foi aberta em 2000. Na festa de inauguração da segunda, no Shopping Iguatemi, em 2010, eu disse a Pedro Herz, proprietário da empresa, que a estante de poesia, comparada ao tamanho da loja, era muito pequena. “Isso é uma questão de demanda”, ele respondeu. Para mim, Brasília não apresentava demanda para duas lojas da Cultura, mas essa demanda foi criada com estratégias de marketing. Hoje, a frequência às lojas se reduziu e as estantes estão cheias de espaços vazios. 

Ao longo de seu processo de expansão, a Cultura nunca se preocupou em criar estratégias para vender livros culturalmente importantes – entre os quais incluo a poesia – mas apenas livros “de mercado”. Por isso, tornou-se uma livraria desinteressante, onde o bom leitor circula sem vontade de comprar. As gôndolas da Cultura deixaram de expor livros instigantes, ao contrário de livrarias menores, onde o propósito é mais cultural que comercial. Com a crise, a situação piorou, porque os estoques, mesmo de livros de maior apelo, não são repostos. Se mesmo antes da crise a Cultura já se recusava a vender livros de editoras menores ou independentes, ou de autores menos conhecidos das panelinhas da mídia, agora até escritores mais conhecidos desapareceram de suas estantes. 

As duas lojas da Cultura acabaram com as livrarias de rua de Brasília, que não existem mais. Em outras cidades, elas sobrevivem, mesmo com a concorrência da Saraiva, que sempre foi mais um supermercado de livros que uma livraria. Numa livraria, o consumidor – leitor – recebe, ou deveria receber, uma assessoria do vendedor para encontrar o livro que pensa em comprar e para conhecer um livro que atenda seu gosto. Isso também não existe mais na Cultura. É coisa do passado. 

Sou a favor do apelo de Luiz Schwarcz e também acho que o Natal deve ser coalhado de livros. Mas, ao comprar, por que não fazê-lo em pequenas livrarias, que também lutam para sobreviver, e por que não atentar para as pequenas editoras? O livro é um produto artesanal, por mais industrializado que seja o processo de sua produção, que é sempre guiado por uma paixão, ainda que apenas enquanto é escrito. As pequenas editoras enfrentam dificuldades, mas também são guiadas pela mesma paixão. Com a vantagem de que as grandes redes não lhes devem milhões de reais, porque jamais se interessaram por elas. 

É PRECISO SILÊNCIO PARA OUVIR MÚSICA


Quando Brasília foi inventada, a civilização parecia prestes a aportar por aqui. Quase 60 anos depois, o que foi feito da cidade democrática, humanista, que garantiria qualidade de vida a seus moradores? Temos trânsito engarrafado, criminalidade e insegurança, falta de mobilidade, estresse, barulho, conflitos urbanos, poluição. Grande parte da área urbana carece de calçadas, muitas de nossas ciclovias dão em lugar algum, áreas centrais estão cobertas de mato, não há transporte público ligando o leste ao oeste (e vice-versa), o poder público não consegue definir como coletar e tratar o lixo, a cidade que reluz em sua arquitetura está sufocada de sujeira em seus pedaços mais íntimos. 

O bem-estar e a convivência pacífica da massa humana que se aglomera na urbe devem ser garantidos por leis civilizatórias, que promovam o respeito ao espaço e à liberdade de cada um. Por enquanto há alguns sinais de que podemos chegar à civilidade sonhada por seus inventores. Brasília foi a primeira cidade brasileira a proibir o fumo em locais fechados, tornando a convivência mais saudável; foi a primeira a adotar o respeito à faixa de pedestre. E conta com uma lei moderna e civilizatória para controlar a poluição sonora, a lei 4.092/2008, que alguns detratores chamam pejorativamente de Lei do Silêncio, como se fosse um instrumento de censura e não de organização da convivência no espaço público. 

Há quem diga que o controle da poluição sonora representa o atraso e uma virada à direita, como se o respeito à lei e aos direitos individuais não representassem a civilidade, e como se a selvageria e o caos fossem nossos ideais políticos. A Lei da Poluição Sonora estabelece parâmetros para controle de emissão de som, não apenas para música, e não são valores aleatórios – são aqueles definidos pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que por sua vez segue valores estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), respeitados internacionalmente. 

Extinguir a Lei da Poluição Sonora ou adotar níveis aleatórios para medição do som significará mais um passo rumo à barbárie da qual Brasília deveria se distanciar. É preciso silêncio para ouvir música. O excesso de ruído – seja ele emitido por motores, betoneiras ou caixas de som – não faz bem para a saúde nem para a cultura, assim como a fumaça do cigarro em ambiente fechado nada tem a ver com liberdade individual. Da mesma forma, não se pode alterar o Código de Trânsito para que o motorista obrigado a parar na faixa de pedestre seja pontual em seu compromisso. 

Se os empresários da noite precisam de renda, é mais lógico que se adaptem à lei, e não a lei a eles. Se alguns músicos – não todos – temem o desemprego, que estimulem os empresários a cumprir a lei. Dizem que o nível sonoro permitido é tão baixo que a conversa de um grupo de pessoas é suficiente para superá-lo, mas se esquecem de que o som de uma conversa não se propaga além de alguns metros, enquanto o som amplificado atravessa barreiras e reverbera por longa distância. A situação piora quando a noite avança, e não se pode chamar de careta ou reacionária uma pessoa que se esforça para dormir quando deve acordar cedo no dia seguinte, seja para trabalhar ou estudar. 

Os artistas que combatem a lei 4.092 parecem ignorar que o Teatro Nacional está fechado há anos, assim como o Museu de Arte de Brasília e o Espaço Renato Russo; que a Biblioteca Demonstrativa fechou por falta de manutenção, e a Escola de Música está sucateada e segue o mesmo destino, e a cidade não tem uma biblioteca pública digna desse nome – e depois tentam nos convencer de que a Lei da Poluição Sonora nos empobrece culturalmente... 

A riqueza cultural de uma cidade não está relacionada à poluição sonora. As pessoas que apoiam a lei também gostam de se divertir, vão a bares e restaurantes, ouvem música e participam da vibração da cidade. Por sua vez, aqueles que defendem o som alto precisarão, em algum momento, de silêncio para descansar, os músicos precisarão de silêncio e sossego para criar, para se concentrar, porque o silêncio é saudável e necessário, porque o silêncio faz parte da harmonia. 

Não se pode confundir controle da poluição sonora com cerceamento cultural, como não se pode confundir violência urbana com progresso, trânsito engarrafado com desenvolvimento, ambiente enfumaçado com liberdades individuais. Uma cidade não precisa ser caótica e barulhenta para ser vibrante, assim como a contemplação e o silêncio podem nos enriquecer culturalmente. A sala onde descansa o piano em que meu amigo músico faz os arranjos para seu próximo show será um ambiente mais agradável e produtivo se não houver uma betoneira no apartamento ao lado. 

[Texto publicado na revista Roteiro Brasília, nº 248, de fevereiro de 2016. 
A ilustração, que circula na internet, retirei do blog Habitável Escafandro]

MONTEIRO LOBATO, RACISTA?


No futuro, quando o Brasil tiver evoluído, educado melhor sua população e se aproximado da civilização, a cena que você vê na foto acima se tornará piada de salão.

Contam os anais do Vaticano que, num passado distante, a alta cúpula da Igreja católica se reuniu durante vários dias para discutir qual era o sexo dos anjos. Ao final da longa maratona de debates, sem chegar a qualquer conclusão, decidiram que os anjos não têm sexo.

A expressão “discutir o sexo dos anjos” se tornou, desde então, sinônimo de discussão infrutífera, sem importância.

No Brasil do futuro, caso o país consiga evoluir, a expressão “discutir o racismo em Lobato” será sinônimo de debater questões inócuas - ainda que a reunião que você vê na foto possa trazer graves consequências. 

Um grupo de advogados preocupados com o racismo decidiu levar ao Supremo Tribunal Federal, a mais alta corte do país, a descoberta de um mestrando em educação na Universidade de Brasília, o técnico em Gestão Educacional Antônio Gomes da Costa Neto. Segundo ele, o livro Caçadas de Pedrinho, um clássico da literatura infantil brasileira, é racista. Por causa dessa ideia, há quem defenda a proibição do livro.

O atraso do Brasil em educação é tão grave que educadores como Costa Neto e alguns integrantes do Conselho Nacional de Educação simplesmente não sabem, não têm noção, do que é literatura.

Literatura não é educação moral e cívica. Não é cartilha escolar. Não é manual de instruções para injetar informação na cabeça de crianças.

Literatura é arte! Será que esse pessoal sabe o que é isso, arte?

A coisa chegou a tal ponto que pessoas supostamente intelectualizadas decidiram levar ao banco dos réus, repito, na mais alta corte do país, um autor clássico da literatura brasileira, Monteiro Lobato.

Muitas gerações descobriram o prazer da leitura com livros de Lobato. Será que todos esses leitores se tornaram racistas?

Racismo é consequência da ignorância, professor. E o melhor remédio contra a ignorância é a leitura. De autores clássicos, mais ainda.

Será que os professores que ensinam nossas crianças estão levando a elas a poesia de Carlos Drummond de Andrade, de Manoel de Barros, de Manuel Bandeira, de Ferreira Gullar?

Em audiência no Supremo, representantes do Ministério da Educação e do Instituto de Advocacia Racial e Ambiental (Iara) concordaram em discutir novamente em 25 de setembro as questões levantadas pelo “racismo” em Lobato. Entre as quais, as relações étnico-raciais em livros adotados pelo sistema de ensino.

Mais importante que o resultado dessa discussão é perceber que, enquanto a literatura não for vista com seriedade nas escolas, a ignorância tende a se alastrar.

Foto: Portal do STF

LITERATURA NAS ESCOLAS

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Para realizar sua primeira feira literária, a Secretaria de Educação, Cultura, Esporte e Lazer da cidade de Passos (MG) optou por priorizar as atividades nas escolas do município. Nada de falsamente grandioso: não foram convidados superstars da literatura nem foram montados pavilhões gigantescos para atrair turistas. Mas o evento deixou marcas profundas em cerca de 20 mil estudantes de 40 escolas. E também nos escritores que participaram.

A I Flipassos foi oficialmente aberta em 8 de maio. No dia 11, sexta, falei sobre a importância dos livros e da literatura a mais de 700 alunos da Escola Estadual Nazle Jabur. Os estudantes haviam lido meu livro Arqueolhar, e fizeram emocionantes apresentações de meus poemas. No mesmo dia, conheci o belo trabalho que os alunos da escola Júlia Kubitschek fizeram sobre o mesmo livro.

Cerca de 30 escritores convidados tiveram atividades semelhantes em várias escolas. Quando não estavam conversando com os estudantes, eram entrevistados na tenda montada na Praça Geraldo da Silva Maia e conversando com o público. Alguns fizeram palestras em auditórios superlotados. Diariamente houve lançamentos de livros, nas dependências do Palácio da Cultura (sede da Secretaria) ou na praça.



No dia 14 de maio, segunda-feira, aniversário dos 154 anos de Passos, os escritores foram homenageados pelas escolas, participando do desfile que atraiu grande público, mesmo debaixo de chuva, à região central da cidade.

Este ano, o tradicional Carnaval da cidade foi cancelado pela prefeitura devido à alta incidência de casos de violência. Os R$ 80 mil investidos na I Flipassos foram remanejados da festa que não houve. O aumento de interesse pelos livros e pela leitura é evidente. Tem havido crescente procura de livros nas bibliotecas escolares, que a Secretaria de Educação e Cultura tem mantido bem equipadas.



Os escritores nascidos em Passos que participaram do evento - este escriba, Antonio Barreto, Marco Túlio Costa, Alexandre Brandão, Marise Pacheco, Benedito José, Sebastião Wenceslau Borges, Deucélia Maciel - se tornaram profetas em sua terra. Uma bela homenagem prestada pela cidade, que pode reverter em enormes benefícios.

O trabalho desenvolvido pela Secretaria de Educação e Cultura e pelas escolas já fez subir o Ideb (índice que mede o grau de educação do município) para 6,3, média prevista para o Brasil em 2020. Investir em educação é garantir um futuro melhor para todos. Passos no caminho certo.  

UMA ODISSEIA NA FICÇÃO


Meu avô morreu em 1975, sem jamais acreditar que o homem foi à lua. Lembrei-me dele ao rever, pela enésima vez, 2001, Uma odisséia no espaço, de Stanley Kubrick, agora com a nitidez proporcionada pelo blue-ray. No filme, um clássico do cinema, dois astronautas viajam em direção a Júpiter numa nave controlada por um computador avançadíssimo, capaz de dialogar, deduzir, refletir e sentir.

Filmado com efeitos especiais nunca vistos no cinema, que até hoje não perderam a força, 2001 foi lançado em 1968, um ano antes da suposta viagem dos astronautas norte-americanos à lua. A epopéia de Neil Armstrong, Edwin Aldrin e Michael Collins foi uma resposta dos Estados Unidos à União Soviética, que haviam colocado um astronauta na órbita da Terra. Em plena Guerra Fria, a façanha foi uma vitória diante dos soviéticos.

 
Existem muitos indícios de que a viagem à lua não passou de uma montagem, uma farsa, uma ficção. Observações nas fotografias dos astronautas no solo lunar, divulgadas pela agência espacial norte-americana Nasa, revelam contradições, como a penumbra, inexistente em ambiente sem atmosfera, marcas de pegada onde não deveriam existir, devido à falta de gravidade, ausência de sinais do propulsor do módulo lunar, exposição dos astronautas à radiação solar, mortal naquelas condições, e muitas outras evidências – ou razões para dúvidas.


Há quem identifique o cineasta Stanley Kubrick numa foto anterior, produzida pela própria Nasa, o que poderia significar que ele contribuiu para a farsa. No contexto político daquela época, poderia ter sido possível ao governo norte-americano convencer alguns participantes da importância da conquista, ainda que fictícia, da lua. 

 
Ao rever o filme 2001, Uma odisséia no espaço, lembrei-me de toda essa história ao observar os detalhes das naves espaciais e especialmente das cenas passadas na lua, em cenário extremamente parecido com o das filmagens da viagem supostamente forjada. Nos créditos, no final do filme, há agradecimento aos cientistas que prestaram consultoria para roteiro e filmagens.

 
Para fazer um filme que, mais de 40 anos depois de lançado, permanece moderno e futurista, Stanley Kubrick e seu parceiro, o escritor Arthur Clarke, precisaram de uma competente assessoria, para que os detalhes científicos não se tornassem inverossímeis. Precisaram também de projetos de naves espaciais e outros equipamentos, que o governo norte-americano e a Nasa poderiam ter cedido, em troca de algum tipo de compensação. Era a parceria perfeita para dois filmes de ficção científica, e não apenas um. 

 
Assim como todas as obras de arte, o filme possui várias camadas de leitura, que vão de uma simples história de ficção a todo o simbolismo sobre a evolução da humanidade. O tempo, o ritmo, a fotografia, os cenários, tudo permanece perfeito. Do gesto do símio que transforma um osso em arma, no início do filme, ao olhar do feto diante da Terra, na cena final, 2001 é uma obra-prima do cinema. Inesquecível.

ABRAÇO ÀS NASCENTES


O Parque Olhos D´Água ocupa 21 hectares na Asa Norte de Brasília, equivalente a uma quadra residencial. É uma área de preservação, com espécies do cerrado, e possui trilhas internas e parquinho infantil. Dentro de seus limites corre um riacho que deságua numa lagoa, e essa água flui em direção ao Lago Paranoá. As nascentes ficam fora da área do parque, e estão ameaçadas pela especulação imobiliária. A população se mobiliza para que o governo determine a integração das nascentes, que ficaM entre as quadras 212 e 213, à área do parque. Este vídeo reporta a manifestação realizada em 25 de setembro de 2011.

BRASÍLIA, 51 ANOS [2]

Tratores destroem o gramado da Esplanada...
...para montar um gramado artificial.
Os gramados da Esplanada dos Ministérios serão palco, no final de maio, de um evento internacional de motocross. A Esplanada é tombada pelo Patrimônio Histórico Nacional e é considerada área intocável, em função do título de Patrimônio da Humanidade concedido pela Unesco a Brasília. Mas o governo do DF ignora isso.
 

Para as comemorações do aniversário da cidade, em 21 de abril, cobriram toda a extensão da Esplanada com circos, palcos, arquibancadas, barracos e até campos de futebol. Provavelmente vão desmontar tudo isso em seguida, deixando os gramados destruídos. Mas será por pouco tempo.

O governo do DF trará para Brasília, no final de maio, o Red Bull X-Fighter, evento internacional de motocross. A empresa Red Bull vai montar uma grande estrutura nos gramados da Esplanada. Se a Esplanada é tombada, a Red Bull não tem nada com isso.
 

Quem anuncia o evento é o secretário de Turismo do DF, Luiz Otávio Neves. Em entrevista à revista Roteiro Brasília, ele anuncia "um show de motocross, de piruetas de motos, iluminação, fogos, um grande espetáculo". Para se ter idéia da qualidade dos secretários que assumiram o "novo" governo do DF.

BRASÍLIA, 51 ANOS

Roupa de festa
Isto é a Esplanada dos Ministérios ou a Feira de Caruaru?

Brasília completa 51 anos de inauguração no dia 21 de abril. A cidade que nasceu das utopias é hoje vítima da cultura do saque e da ganância. A cidade que surgiu das pranchetas como um projeto de obra de arte vai aos poucos incorporando o espírito da favelização: ocupação desordenada, desprezo pelo planejamento urbano, desrespeito aos monumentos históricos.

Para a comemoração do aniversário de 51 anos, o Governo do DF, em vez de embelezar a cidade, enche a esplanada de barracos, palcos, arquibancadas, altares e até campos de futebol. Destrói o gramado e faveliza a área mais importante da cidade.

Pelo projeto original de Brasília, a Esplanada dos Ministérios foi desenhada para ser um grande espaço aberto, por onde se pudesse observar o Congresso Nacional desde a rodoviária. A Esplanada é tombada pelo Patrimônio Histórico e faz parte da área tornada intocável pelo título de Patrimônio Cultural da Humanidade, concedido pela Unesco. Ali, é proibida a execução de qualquer edificação acima do solo, de forma a garantir total visibilidade do Congresso Nacional.

Com todo respeito à Feira de Caruaru, Brasília é outra coisa. A Feira de Caruaru é um grande encontro espontâneo, uma festa popular. O atrativo de Caruaru é a multidão e a muvuca bem organizada; o da Esplanada dos Ministérios é o espaço vazio. Os governos querem atrair turistas para Brasília, mas se esquecem de manter a cidade bem arrumada para quando eles chegarem.

Assim como o governo local pratica e é conivente com esses atentados contra a integridade da cidade, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) se omite e o Instituto dos Arquitetos do Brasil silencia. Então, por que a população, que tantas vezes se levantou em defesa de Brasília, não grita? Ou será que essa população, outrora consciente e atuante, agora prefere ouvir a música de péssima qualidade que emana dos palcos na Esplanada?


[A foto que ilustra esta postagem foi tomada emprestada ao Correio Braziliense]

O LINCHAMENTO DE MARIA BETHÂNIA

A semana que começou no Dia Nacional da Poesia, 14 de março, foi marcada por uma tentativa de linchamento, na internet, de uma das mais importantes artistas da música brasileira: Maria Bethânia. A partir da revelação, por um jornal paulista, de que o Ministério da Cultura aprovara um projeto que prevê a gravação de 365 vídeos em que a cantora lê poemas importantes da língua portuguesa, uma horda de gente preconceituosa e mal informada avançou contra ela com paus e pedras.
 
 O projeto O mundo precisa de poesia foi apresentado ao Ministério da Cultura pela Quitanda Produções Artísticas, e previa a captação de R$ 1,79 milhão, por renúncia fiscal, para a produção e veiculação dos vídeos, um por dia, durante um ano. O Ministério aprovou, reduzindo o valor para R$ 1,3 milhão. De acordo com a Lei Rouanet, esse valor poderá ser obtido junto a empresários, que descontarão uma parte dele ao pagar seus impostos de renda. Portanto, o Ministério não deu o dinheiro, apenas autorizou a produtora a solicitá-lo ao empresariado.

 
De acordo com a proposta, os vídeos serão veiculados em um blog na internet, no YouTube e outros espaços, um por dia, durante um ano, e estarão acessíveis para quem quiser vê-los e copiá-los. A seleção dos poemas será feita pela própria Maria Bethânia, que ao longo de uma irrepreensível carreira de mais de quatro décadas tem prestado inestimável serviço não apenas à melhor música brasileira, como também à poesia de língua portuguesa, levando a obra de autores como Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes, Sophia de Mello Breyner Andresen e inúmeros outros a um público totalmente seduzido pela beleza de suas interpretações.

 
Ao tornar acessíveis, pela internet, 365 poemas de primeira grandeza, Maria Bethânia levará a poesia a um público nem sempre íntimo dessa arte, hoje disponível apenas em livros de circulação restrita. A interpretação de Maria Bethânia resgata a oralidade da poesia, revelando sua beleza a pessoas que nem sempre compreendem os mistérios dessa linguagem. 

 
O episódio merece reflexões profundas. É assustadora a reação das pessoas, entre as quais há até mesmo poetas brasileiros que deveriam ter aplaudido a iniciativa, pois, afinal, como diz o próprio título do projeto, o mundo precisa de poesia, e o Brasil muito mais. Sabemos que o Brasil é um país iletrado, mas pior que isso é nossa vocação para cultuar a ignorância. Entre as manifestações que se reproduziram em redes sociais, blogs e seções de comentários dos jornais, era evidente que a grande maioria dos que protestaram o fizeram pelo simples prazer de protestar, sem ler o projeto, sem saber o que é a Lei Rouanet ou conhecer suas regras, e especialmente por um sadismo pouco disfarçável, alimentado pelo covarde ataque em massa a uma pessoa que obteve prestígio nacional graças a seu talento, coerência e integridade.

 
A obtenção de recursos para produções culturais, via renúncia fiscal, é prática comum e totalmente legítima, prevista em lei. Shows, DVDs, livros, filmes, peças de teatros, CDs são produzidos dessa forma. Pode-se questionar a qualidade dos artistas e vários outros aspectos, mas a aprovação, ou não, do projeto obedece a critérios puramente técnicos, e assim deve ser. 


O mais irônico dessa história é que a maior parte dessas produções não presta qualquer contribuição à cultura brasileira, e nem por isso se organizam protestos contra essa ou aquela. Turnês gigantescas, promovidas por empresas multinacionais, com retorno financeiro garantido, e que nenhuma contrapartida oferecem, são produzidas dessa forma. Há artistas descaradamente comerciais que assim gravam CDs e DVDs, vendidos a preços de mercado. Filmes sem qualquer valor cultural, lançados com estrondosas campanhas de marketing, são patrocinados pela mesma lei. 
 
Qual é o mistério por trás da campanha contra Maria Bethânia? Eu tendo a acreditar, mesmo sem querer, que se a produtora houvesse apresentado um projeto de R$ 2 milhões, ou R$ 5 milhões, apenas para uma turnê de shows de Maria Bethânia, ou gravação de um DVD, não teria havido tal reação. Ninguém protesta contra os milhões obtidos por artistas como Ivete Sangalo, Roberto Carlos, Gilberto Gil, duplas sertanejas ou grupos de axé. O filme Bruna Surfistinha captou R$ 4 milhões da mesma forma. Ninguém protestou. A Lei Rouanet viabiliza a produção de artistas importantes, mas também patrocina o esgoto da cultura brasileira. Tudo sob respeitoso silêncio. Praticamente todos os filmes produzidos no Brasil, alguns vistos por não mais que 3 mil, 5 mil pessoas, obtêm financiamento da mesma maneira. 

 
Duas palavras mágicas desencadearam a onda de protestos contra Bethânia. A primeira é “blog”, um espaço gratuito na internet, onde qualquer um escreve o que quiser. A segunda é “poesia”, uma arte vítima de muitos preconceitos, que para alguns é apenas obra de desocupados (como se a campanha contra Bethânia não fosse também obra de desocupados). As pessoas não entenderam, ou não quiseram entender, que o projeto O mundo precisa de poesia prevê captação de recursos não para a produção de um blog, e sim para a produção de 365 vídeos de nível profissional. E também não se percebe que a Poesia pode prestar grande contribuição para melhorar a qualidade de nossa educação e, em cascata, ajudar a aprimorar nosso senso crítico e nossa capacidade de reflexão. 

 
A onda de protestos encontrou terreno fértil também na irresponsabilidade da imprensa, que adora esse tipo de polêmica, mas é incapaz de analisar a fundo o alcance de um projeto que, ao contrário de quase todos os outros, pode ser uma valiosa ferramenta para as escolas, de todos os níveis, e que levará a melhor poesia de língua portuguesa a um público imensurável. E criará um acervo de grande importância, para agora e para o futuro. Esse desdobramento previsto pelo projeto da Quitanda não existe nas produções meramente comerciais, algumas até mesmo nefastas para nossa cultura, que se multiplicam sob o patrocínio da Lei Rouanet.

 
Maria Bethânia tem uma história irrepreensível e merece respeito. A Poesia também.

[O proprietário deste blog tomou a liberdade de usar a foto de Juan Guerra, da Agência Estado, para ilustrar este texto] 

A FEIRA DO LIVRO E OS ESCRITORES

 A Feira do Livro de Brasília acontece este ano no Pavilhão de Exposições do Parque da Cidade. Começa nesta sexta-feira, 8. Finalmente a retiraram do shopping Pátio Brasil, o que é uma grande evolução. No entanto, a Câmara do Livro do DF segue cometendo seus equívocos e pouco fazendo para aproximar o público brasiliense da leitura e, mais importante, de seus escritores.

Na página da feira na internet, o secretário de Cultura, Silvestre Gorgulho, publica um artigo sobre as virtudes do livro. Será que ele se lembra do desprezo demonstrado pelo governo do DF pela Bienal Internacional de Poesia de Brasília, que teve que ser cancelada este ano? Aliás, se o governo local tivesse algum apreço pelos livros, a Biblioteca Nacional de Brasília já estaria consolidada há muito tempo.

Mas os escritores de Brasília seguem em frente. Este ano, cinco deles - Reynaldo Jardim, Sérgio Maggio, José Rezende Jr, Anderson Braga Horta e Graça Ramos - foram finalistas do Prêmio Jabuti, promovido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), e os três primeiros, premiados. O poeta Ronaldo Costa Fernandes recebeu da Academia Brasileira de Letras o prêmio de melhor livro de poesia do ano com A máquina das mãos.  No entanto, não vi o nome de nenhum desses autores na programação da Feira do Livro de Brasília, nem para uma palestra, um bate-papo com os leitores ou um lançamento. Assim é difícil.

Para completar, os potenciais visitantes da Feira não parecem muito preocupados com livros ou leitura. Quase todos os internautas que inseriram comentários no site da Feira do Livro estão preocupados com shows de música que, depois de anunciados, foram cancelados. Ninguém pergunta, por exemplo, por que o poeta Ferreira Gullar, que este ano completou 80 anos, lançou um novo livro e foi homenageado em vários cantos do país, não foi convidado para comparecer.

E depois querem fazer de Brasília a capital da leitura... 

BONS TEMPOS AQUELES

Trabalhei na sucursal de Brasília do Jornal do Brasil entre 1985 e 1988, e considero esse período a mais importante experiência da minha vida profissional. O JB, apesar da fama de empresa eternamente endividada, era um dos quatro grandes da imprensa nacional, e na opinião da maioria dos jornalistas, o melhor de todos. Ali estava o jornalismo mais criativo, o melhor texto, as reportagens mais originais.

Hoje, 31 de agosto de 2010, circula pela última vez a edição impressa do Jornal do Brasil, fundado há 119 anos e mergulhado numa dívida de R$ 800 milhões. As últimas edições tiveram tiragem de 30 mil exemplares, segundo o próprio jornal, que, nos anos 60, chegou a tirar 230 mil exemplares aos domingos. A partir de agora, o JB será lido apenas na internet, em "nova e melhor fase", anunciada por um editorial que enaltece o "primeiro jornal 100% digital"...

Em meados dos anos 80, quando a redação brasiliense tinha uns 30 jornalistas, os grandes jornais brasileiros adotavam a impressão offset, com fotos a cores e importantes mudanças gráficas. Só o JB, primo pobre, continuava com o anacrônico sistema leterpress, pouco mais evoluído que a tipografia. As fotos, sempre em preto-e-branco, tinham baixa nitidez, o que não tolhia o talento dos fotógrafos.

Ricardo Noblat era o editor executivo da sucursal, dirigida por Luiz Orlando Carneiro. O braço direito de Noblat era João Santana, um talentoso ex-poeta, que no passado era conhecido como Patinhas e escrevia belas letras para as canções da banda baiana Bendegó. Hoje ele abandonou também o jornalismo e transformou-se em vendedor de ilusões... Que evolução!

O lendário colunista político Carlos Castelo Branco publicava todos os dias na página dois, e eventualmente aparecia na redação para entregar sua coluna datilografada. Luiz Orlando raramente saía de sua sala, afastada da redação, mas de vez em quando aparecia para um comentário interessante, um papo rápido com os repórteres presentes. Além de jornalista, Luiz Orlando é um dos maiores especialistas brasileiros em jazz, essa forma elevada de música, e desenhista diletante. Dois de seus desenhos a crayon, de temática jazzística, decoram uma parede de meu apartamento.

"Jornalista trabalha melhor sob tensão", ensinava Noblat, que atribuía a si essa nobre missão - estressar os repórteres. Contam as lendas da época que todos os jornalistas da redação mantinham agenda semanal com a mesma psicanalista. Ao chegar um novato, ela advertia: "Fale-me de sua mãe, porque do Noblat eu já sei tudo."

Bons tempos aqueles. Acho que estou ficando velho. Não há mais JB nas bancas e tenho cada vez mais histórias para contar.