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[crônica] A VOLTA DO SERESTEIRO

 
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Aí está a minha coluna publicada quinzenalmente na Folha da Manhã, de Passos (MG), edição desta sexta. O tema é o poder da música de restaurar antigas histórias. Boa leitura e bom fim de semana! 

[crônica] O LADO ILUMINADO DA MÚSICA

 
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Em minha coluna quinzenal publicada no jornal Folha da Manhã, de Passos (MG), o tema desta sexta-feira, 10 de março, é o meio século de lançamento do álbum mais icônico do Pink Floyd. Boa leitura e ótimas audições! 

[crônica] NA ESTRADA COM BOB DYLAN

 
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Uma homenagem aos 80 anos do poeta que levou o rock à Academia Sueca. Na Folha da Manhã, jornal de Passos (MG). 

LIBERDADE E TRANSCENDÊNCIA EM LEONARD COHEN


Suzanne conduz você a seu recanto junto ao rio. Ouvindo os barcos que partem, você quer passar a noite ao lado dela. Sabe que ela está quase louca, mas é por isso que você quer ficar lá. Quer viajar com ela, viajar às cegas, e sabe que ela confiará em você, pois você tocou seu corpo perfeito com o pensamento.  Eis alguns trechos da primeira canção de Leonard Cohen que o mundo ouviu, Suzanne, que traz algumas das principais características da obra do compositor e poeta canadense que morreu em 7 de novembro aos 82 anos. Personagens femininas ora reais, ora mitológicas; inspiração, citação e recriação de personagens e cenas bíblicas, históricas ou lendárias; erotismo às vezes velado, às vezes explícito; uma espiritualidade incontida, que parece filtrar o olhar de Cohen sobre o mundo e sobre as coisas, por mais profano e vulgar que ele às vezes tente parecer. Mas a poesia elaborada de Leonard Cohen é pura transcendência, um daqueles sinais emitidos pelos grandes artistas de que a humanidade já é capaz de galgar um degrau acima da barbárie e da incivilidade.

Ao morrer, com a mesma discrição que adotou em importantes momentos de sua vida, Leonard Cohen deixou uma coleção de canções e poemas que guardam segredos ainda a descobrir, palavras a compreender, belezas a eclodir lentamente. O artista arredio dos primeiros anos, compositor meio a contragosto, se transformou aos poucos em personagem instigante, ansioso por compreender o ser humano de seu tempo, dotado de olhar sempre atento para a História, dono de uma elegância vinda desde o berço e incontestável carisma. Seu primeiro disco, Songs of Leonard Cohen, lançado em 1968, já com a idade de um veterano da música – 34 anos – chegou depois de quatro livros de poemas e dois romances, o que lhe garantia considerável cacife para construir belas letras, numa época em que a música pop e o rock portavam a voz da juventude.

Nascido em Montreal, no Canadá, de tradicional família judia, Leonard foi educado para ser um homem de negócios de sucesso, mas ele se encantou com a poesia. É desses desvios que certas criaturas experimentam e jamais voltam a ser as mesmas. Por volta de 15 anos conheceu a obra do poeta espanhol Federico Garcia Lorca, morto na guerra civil em 1936, e se encantou. Aos 21, publicou seu primeiro livro de poemas, Let us compare mythologies, bem recebido pela crítica, que destacou a maturidade de seus versos e o domínio da linguagem. 

O livro já trazia elementos comuns da poesia de Cohen. A influência da cultura judaica, muito presente em toda a sua formação, não só pela educação que recebeu como também pela história da família e o ambiente comunitário onde cresceu, e uma certa perplexidade diante do inexorável. O poema Lovers remete ao Holocausto, ao descrever o amor de um casal num cenário em ruínas e entre as chamas de um forno. “Quando as chamas se erguiam/ ele tentou beijar seus seios ardentes/ enquanto ela queimava no fogo”. Outro poema, Rites, descreve a morte do pai, Nathan Cohen, ao lado da família e em ambiente tipicamente judeu. 

NOVE ANOS – A perda do pai, quando Leonard tinha 9 anos, guarda uma relação simbólica com sua poesia. Após a cerimônia do velório, ele pegou no armário uma gravata do pai, e nela escondeu um pequeno pedaço de papel, onde havia escrito algo. Em seguida, a enterrou no jardim de casa, sob a neve. Ao longo dos anos escavou o quintal por várias vezes, na esperança de encontrar o bilhete. Foi a primeira coisa que escreveu na vida, e dizia que sua poesia era a procura daquelas palavras, de que não conseguia se lembrar.  

Nove anos também era a idade do garoto Isaac, da história bíblica sobre o sacrifício de Abraão, a quem Deus pediu o sacrifício do filho. É recontada por Cohen na canção Story of Isaac. “A porta abriu devagar/ e meu pai entrou/ eu tinha nove anos/ seus olhos brilhavam/ e sua voz era muito fria./ Disse, tive uma visão/ e você sabe, sou forte e santo/ tenho que fazer o que me mandaram./ (...)/ Subimos a montanha/ eu, correndo, ele a caminhar/ levando o machado de ouro./ (...) Vocês que se erguem sobre as crianças/ com suas lâminas afiadas e sangrentas/ não estiveram lá antes/ quando me deitei sobre a montanha/ e a mão de meu pai tremia/ com a beleza da palavra.” 

Esta canção está no segundo disco de Leonard Cohen, Songs from a room, em que gravou algumas preciosidades de sua carreira, como Bird on the wire. Outra canção de grande beleza incluída no segundo álbum é Seems so long ago, Nancy, com que Leonard homenageia uma jovem de Montreal, que se matou quando seu filho ilegítimo foi tomado dela. “Parece que faz tanto tempo/ nenhum de nós era forte/ Nancy usava meias verdes/ e dormiu com todo mundo/ (...) /Acho que se apaixonou por nós/ Em mil novecentos e sessenta e um/ (...)/ Parece tanto tempo/ um quarenta e cinco contra a cabeça/ um telefone fora do gancho/ (...)/ Na solidão da noite/ quando você está frio e sonolento/ pode ouvi-la falar livremente/ que está feliz porque você veio”. No verso final, no original em inglês, Cohen faz um trocadilho, já que “she´s happy that you´ve come” pode se referir tanto à chegada de uma pessoa quanto ao orgasmo no ato sexual. 

A julgar pela história que o poema conta, se verdadeira em parte ou no todo, pode-se considerar que Leonard teria feito sexo com a jovem, e assim a teria homenageado para expiar possível sentimento de culpa? Mulheres que passaram pela sua vida, como Suzanne Verdal, Marianne Ilen e a cantora Janis Joplin se tornaram personagens das canções. Marianne, a bela norueguesa que Leonard abordou num mercado da ilha de Hidra, na Grécia, em 1969, e morreu em julho deste ano, foi talvez a maior paixão de sua vida, ainda que as paixões tenham sido sempre efêmeras. Ela é a personagem de So long, Marianne, composta quando viviam juntos e gravada no primeiro álbum de Cohen. “Adeus, Marianne/ é tempo de começarmos/ a rir, a chorar, a chorar, a rir/ sobre tudo isso outra vez/ Sabe que amo viver com você/ mas você me faz esquecer de tanta coisa/ eu me esqueço de rezar pelos anjos/ e os anjos se esquecem de rezar por nós”. 

Janis Joplin não tem seu nome citado, mas é de conhecimento público que ela é a mulher de Chelsea Hotel #2, uma das mais populares – e belas – canções de Cohen. Está em seu quarto álbum, New skin for the old ceremony, e começa com a descrição de uma cena de sexo: “Eu me lembro de você no Chelsea Hotel/ falava com contundência e doçura/ você me chupava na cama desfeita/ enquanto as limusines esperavam na rua.” E prossegue: “Você se foi, e nunca a ouvi dizer/ preciso de você, não preciso de você/ e toda essa conversa// Eu me lembro de você no Chelsea Hotel/ você era famosa, seu coração uma lenda/ disse-me que preferia homens bonitos/ mas para mim abriria uma exceção”. 

PERSONA – Leonard Cohen construiu uma persona que divide espaço com ele próprio no imaginário de seus fãs. Em seus poemas é visível a presença desse personagem sombrio e atormentado, mas generoso e solidário, inconformado com as injustiças, que parece indicar o amor como o remédio contra a desesperança. Leonard está sempre lá, no cerne de suas canções, e talvez isso o torne tão próximo. Essa presença é marcante especialmente em uma canção, Famous blue raincoat, que deixa no ar uma pergunta: que história teria motivado esse poema em forma de carta, em que chama alguém de “meu irmão, meu assassino” e diz que o perdoa? Na gravação original, do terceiro álbum, Songs of love and hate, a canção-carta termina com a assinatura “L. Cohen”. 

Rica em personagens femininas, a obra de Leonard Cohen tem ainda mulheres lendárias ou bíblicas, como Betsabá, amante do Rei Davi, e Dalila, esposa de Sansão, ambas da Bíblia. Elas aparecem de passagem em sua mais conhecida canção, Hallelujah, lançada no sétimo álbum, Various positions, e gravada por mais de 500 intérpretes em todo o mundo. “Ouvi dizer sobre um acorde secreto/ que Davi tocava e agradava a Deus/ mas você não se importa com música, não é?/ ela vai assim/ a quarta, a quinta/ a menor cai, a maior sobe/ o rei confuso cantando aleluia// sua fé era forte, mas precisava de provas/ você a viu banhando-se no terraço/ sua beleza e a luz da lua derrubaram você/ ela o amarrou na cadeira da cozinha/ quebrou seu trono/ cortou seu cabelo/ e dos seus lábios arrancou um aleluia/.” 

Joana d´Arc é outra personagem mítica que ganha vida na música de Cohen, numa versão poética para a história da guerreira francesa, declarada herege por um tribunal da Igreja em 1431 e condenada à fogueira, depois de lutar pela França contra as tropas inglesas. No poema de Cohen, o fogo é o macho sedutor, a quem ela se entrega como se se entregasse a um amor. Joan of Arc foi originalmente gravada em Songs of love and hate

Reverente aos grandes poetas, Leonard Cohen se inspira em um poema do grego Konstantinos Kavafis, O deus abandona Antônio, para escrever uma de suas obras-primas, Alexandra leaving. Kavafis parte de uma cena lendária, a batalha entre os exércitos de Otávio Augusto e de Marco Antônio e Cleópatra, vencida pelo primeiro, para promover uma reflexão existencial sobre as perdas e os sonhos frustrados. Já Leonard toma o nome da cidade de Alexandria, citada por Kavafis, para nomear a musa de seu poema, Alexandra, e refletir sobre a perda do amor. É indispensável destacar a belíssima interpretação de Sharon Robinson no álbum Leonard Cohen live in Dublin, composto de três CDs e um DVD, gravado já no final da última turnê de Cohen, em setembro de 2013. 

BUDISMO – O poema que deu origem a essa canção, assim como vários outros que compõem seu décimo álbum, Ten new songs, faz parte do Book of longing, livro lançado por Cohen após sair do monastério budista Mont Baldy, nos arredores de Los Angeles, nos Estados Unidos, onde viveu isolado durante cinco anos. O CD é compartilhado com Sharon Robinson, que compôs as melodias e fez os arranjos. Sharon também o acompanhou, como backing vocal, nas suas duas últimas turnês, entre 2008 e 2013. 

Antes de se isolar no monastério, Cohen havia lançado I´m your man, em 1988, e, quatro anos depois, The future, um álbum mais político, que parecia trazer à tona sua face mais atormentada. Na faixa título ele cita o muro de Berlim, Hiroshima e tragédias de nosso tempo para dizer: “Eu vi o futuro, ele é assassinato”. Desta canção também faz parte um belo verso de Cohen: “Vi nações crescendo e caindo/ Ouvi suas histórias, ouvi todas elas/ mas o amor é o único mecanismo de sobrevivência”. Em Anthem, ele diz: “Toque os sinos que ainda podem tocar/ Esqueça as oferendas perfeitas/ em tudo há uma fissura/ por onde a luz se aventura” (em tradução livre). 

A este se seguiu um ano de turnê, e o Canadá lhe prestou homenagens e prêmios por seus discos e livros. Mas Cohen arrumou uma mochila e foi comemorar seu sexagésimo aniversário, em setembro de 1994, no mosteiro de Mont Baldy. De lá só saiu em 1999, para a Índia, onde foi estudar com o mestre Ramesh Balsekar, com quem passou pouco menos de um ano. Entre esses estudos, meditação zen e rituais judaicos, Cohen prosseguia sua busca interior e tentava afastar suas tendências depressivas, mas o que parece tê-lo curado de fato foi a música e a poesia. 

Em sua última década de vida, Cohen se dedicou à criação. A partir de 2004, quando completou 70 anos, ele gravou quatro álbuns de estúdio, com canções inéditas – Dear heather (2004), Old ideas (2012), Popular problems (2014) e You want it darker (2016) – e mergulhou de cabeça em longas turnês, que promoveram seu reencontro com um público cada vez maior e mais reverente. 

Já no disco de 2004 ele refletia sobre sua relação com as mulheres: “Por causa de algumas canções/ em que falo de seus mistérios/ mulheres têm sido muito gentis/ com minha idade avançada// criam um lugar secreto/ em suas vidas agitadas/ e me levam para lá/ desnudam-se de várias formas/ e dizem: ‘olhe para mim, Leonard/ olhe para mim uma última vez’”. 

DESPEDIDA – Seu próprio nome volta a entrar na letra de Going home, que abre o álbum Old ideas: “Amo falar com Leonard/ ele é um esportista e um pastor de ovelhas/ é um bastardo preguiçoso/ que vive dentro de um terno”. Quando lançou esse disco, Cohen estava encerrando sua última turnê, em que parecia, finalmente, sereno e em paz consigo mesmo. Nas casas de espetáculos sempre superlotadas, com milhares de fãs reverentes, ele parecia dirigir-se a um grupo de amigos próximos que o rodeavam, como nas primeiras vezes em que cantou em ambientes universitários no Canadá ou Estados Unidos. 

Seu último álbum, You want it darker, é claramente uma despedida, embora seus fãs tenham resistido a vê-lo dessa forma ao longo dos 17 dias que separaram seu lançamento e a morte do compositor. O CD foi para as lojas no dia 21 de outubro de 2016, exatamente um mês depois de Cohen completar 82 anos. Em duas canções, Cohen repete o verso “estou fora do jogo”. Na faixa título, que abre o disco, aparece o coro da Congregação Shaar Hashomayim, da sinagoga que Cohen frequentava na infância, e seu vocalista, Gideon Zelemayer. Assim Cohen fechava o ciclo, o que não o impediu de cantar também uma de suas belas canções de amor: “Se o sol perdesse a luz/ e vivêssemos uma noite sem fim/ e nada mais pudéssemos sentir/ seria assim que o mundo me pareceria/ se eu não tivesse seu amor/ para torná-lo real”. 

Dos seus primeiros anos em Montreal até sua morte em Los Angeles, da solidão dos nove anos até os últimos momentos ao lado do filho, Adam Cohen, que produziu seu último álbum, Leonard Cohen foi o que ele próprio descreveu naquela que considerava sua mais simbólica canção, Bird on the wire, criada no início dos anos 1970, quando vivia na ilha grega de Hidra de forma quase edênica, entre o sol, o mar, as canções, a poesia, as mulheres, os amigos. “Como um pássaro no fio/ como um bêbado numa cantoria à meia-noite/ eu vou tentando ao meu jeito ser livre”. A poesia e a música fizeram de Leonard Cohen um homem livre. Às vezes como um pássaro, às vezes embriagado pela arte com que engrandeceu o mundo. 
  
Artigo publicado no jornal Estado de Minas, 16/12/2016

Foto: Dominique Issermann

Leia poemas e canções de Cohen na postagem anterior

SÉRGIO DUBOC É COISA NOSSA!


O cantor e compositor Sérgio Duboc é um dos pioneiros do Liga Tripa, grupo e movimento poético-musical que surgiu em Brasília no início dos anos 80. Faz parte, portanto, de uma linguagem, uma cidade e um tempo emblemáticos. Brasília havia sido inaugurada há 20 anos, e portanto era uma cidade ainda em busca de identidade. O país ainda vivia tempos de ditadura e censura. E a música do Liga Tripa, que reunia artistas vindos de várias partes do país, embalou essa cultura nascida de uma experiência absolutamente nova.

Como se vê, o Liga Tripa, que já tem mais de 30 anos, só poderia ter surgido em Brasília e sua música é capítulo obrigatório na história cultural da capital brasileira, hoje uma cidade já consolidada e com excesso de problemas urbanos e políticos, portanto, a cara do Brasil.

Sérgio Duboc é parte dessa história. E será em homenagem e solidariedade a ele que músicos e poetas de Brasília se reunirão para uma grande festa no palco do Teatro dos Bancários, na próxima quarta-feira, 14 de maio. Duboc se recupera de um problema de saúde que o surpreendeu há algumas semanas, em Goiânia, e ainda vai mantê-lo no estaleiro por algum tempo.

Mas Duboc não é qualquer um e os espíritos que tentavam conduzi-lo ao "outro lado" - segundo relato dele mesmo - devem estar convencidos que pegaram o cara errado. Duboc bateu o pé, brigou, esbravejou, se segurou, disse que não iria e não foi. "Eu disse pra eles que meu lugar é aqui e daqui não sairia", conta. "Eles, quem?" "Sei lá, uns demônios que me cercaram", disse.

Agora será diferente. O palco do Teatro dos Bancários estará lotado de amigos. Será um belo show poético-musical. Além de poesia e música, o evento contará com um bazar em que serão vendidos CDs, livros e trabalhos de artistas da cidade, com renda revertida para Sérgio Duboc. 

O VAGABUNDO SAGRADO

A lenda do Vagabundo Sagrado, por meu amigo Ivan Sérgio e sua lendária banda. Ivan é autor do romance No submundo do sucesso, em que ele conta a história de um roqueiro que oscila entre inferno e paraíso, paraíso e inferno. Ele diz que o romance é autobiográfico, mas há controvérsias... Mas a lenda do Vagabundo é demais!



[discoteca afetiva] OUVIR SEM PARAR

Liebe Paradiso: como um livro
Classificar obras de arte com expressões como "o melhor", "o maior", "o mais importante" me parece um gesto injusto, antipático e arrogante, porque pressupõe uma tentativa de impor o julgamento de quem o faz sobre os critérios do leitor, ou receptor. No entanto, vou tomar a liberdade de dizer que nenhum CD lançado no Brasil em 2011 me proporcionou tamanho prazer quanto Liebe Paradiso, de Celso Fonseca e Ronaldo Bastos. É de ouvir sem parar.

A história da música brasileira está cheia de exemplos de parcerias inesquecíveis, como Toquinho e Vinícius, João Bosco e Aldir Blanc, Ivan Lins e Vitor Martins e inúmeras outras. Agora, se você ainda não se tocou, preste atenção nessa dupla, que já criou alguns álbuns de primeira grandeza.

Em 1997, Celso Fonseca gravou o CD Paradiso, segundo resultado de suas parcerias com o letrista Ronaldo Bastos, cujo talento já era conhecido desde o Clube da Esquina. Paradiso é um CD belíssimo, do primeiro ao último acorde. Por isso, a ideia de recriar o disco pode ter soado meio incompreensível.

Pois foi justamente o que eles fizeram. E reuniram um time - aliás, vários - de primeira grandeza para participar do trabalho. Recriaram todas as faixas e acrescentaram duas, retiradas de outros CDs da dupla. O resultado é brilhante e, por que não dizer, indescritível, porque só ouvindo o CD - do princípio ao fim, como se lê um livro - será possível compreender esses comentários.

Além da bela voz de Celso Fonseca, outras grandes estrelas interpretam essas canções. É emocionante ouvir Luiz Melodia, Adriana Calcanhotto, Milton Nascimento, Paulo Miklos, Nana Caymmi, além de outros artistas excepcionais que participam, como Marcos Valle, João Donato, Robertinho Silva, Nivaldo Ornelas... e outros, muitos outros. E aqui destaco a participação de Antonio Cícero, declamando um belo poema.

Liebe Paradiso foi citado em várias listas de melhores CDs do ano. É o bastante. Não vou dizer que é melhor que outros citados. Mas vou dizer que cada faixa, ao tocar, nos parece a melhor do disco. Ao chegar ao final, fica aquela indecisão e somos obrigados a ouvir de novo. E assim indefinidamente. Obrigado pelo presente, Celso e Ronaldo!

O TRAVESTI DO AMAURY

O jornalista Amaury Ribeiro Jr. virou celebridade nas redes sociais. O nome não me era estranho. Fui ao Google e uma matéria da Folha de S. Paulo me informou que ele é ligado ao "grupo de inteligência" da campanha de Dilma Rousseff. Não confio muito na Folha, mas se a matéria não foi desmentida, deve ser verdade.

Amaury escreveu o livro Privataria Tucana, bombando entre os best-sellers. O livro é um cozinhado de um dossiê que ele preparou contra José Serra - primeiro por encomenda de Aécio Neves, depois vendido ao PT. É estranho, mas são coisas da política.

Como se vê, Amaury só circula entre bonna gente. Mas eu sabia que o conhecia de outras plagas. Afinal, detesto os políticos - todos os políticos - e deles quero distância, assim como de seus agregados. Aí fui pesquisar minha coleção de bolachões, e achei uma preciosidade, o LP Precoce, do Amaury, lançado em Belo Horizonte em 1992. O disco é raridade até nos sebos. Certamente a produção de dossiês é muito mais lucrativa do que a música, mas até que Amaury levava jeito.
  
 


LEONARD COHEN DE VOLTA!


Algumas das questões mais profundas da condição humana são abordadas nas canções de Old Ideas, novo CD de Leonard Cohen, que terá lançamento mundial no dia 31 de janeiro. É o 12º disco de estúdio do genial bardo canadense, e ele está em plena forma, do alto de seus 77 anos. Depois de uma turnê mundial iniciada em maio de 2008 e encerrada em dezembro de 2010, Cohen lança 10 canções inéditas, das quais apenas duas foram apresentadas durante a turnê. O álbum é produzido por  Patrick Leonard, Anjani Thomas, Ed Sanders e Dino Soldo. Cohen está, como sempre, apoiado por belos vocais femininos: Dana Glover, Sharon Robinson, The Webb Sisters (Hattie e Charley Webb) e Jennifer Warnes. A arte da capa é do próprio Leonard Cohen. Agora, é controlar a expectativa!

QUE U2, QUE NADA!


Segundo fim de semana de abril, o clima de São Paulo oscila entre sol, nuvens e ameaça de chuva e os hotéis estão superlotados. Noventa e nove por cento dos turistas que invadiram a cidade neste sábado vão se reunir todos no mesmo lugar. À noite, a banda irlandesa U2 faz um megashow no Morumbi. 
 
Nada contra. Mas o que me levou a São Paulo foi um histórico encontro, visto apenas por algumas centenas de privilegiados, nas belas instalações do Sesc no bairro de Belenzinho. Ali, Egberto Gismonti e Naná Vasconcelos, músicos brasileiros de enorme prestígio internacional, se reencontraram para reinterpretar o Dança das Cabeças, álbum mitológico que gravaram na segunda metade da década de 70.
Daniel, Nádia, Egberto e Naná
 
Sem tumultos e fácil estacionamento, chegamos na companhia de Daniel e Ana, que nos garantiram antecipadamente os melhores lugares da platéia de 400 lugares: na primeira fila, de frente para o palco, onde Gismonti e Naná, com entendimento perfeito e sua reconhecida capacidade de improviso, extasiaram o público.
 
Não tenho fotos do show para mostrar. Era proibido fotografar e, mesmo que não fosse, seria difícil. A presença daqueles seres iluminados no palco criava um ambiente de tal harmonia que o simples espocar de um flash poderia quebrar. Havia tal equilíbrio entre o silêncio e as delicadas ondas sonoras emitidas pelos músicos que qualquer movimento, qualquer ruído estranho, uma tosse ou um disparador de câmera, poderiam interromper. A memória se encarregaria de gravar aquele acontecimento. Era melhor assim.
Este escriba e Naná
 
Na saída, Egberto e Naná atenderam com simpatia aos pedidos para posar para fotos e autografar discos, CDs e vinis que apareceram aos montes nas mãos de fãs deslumbrados. Dança das Cabeças vem atravessando as décadas com o mesmo encantamento misterioso que lhe valeu dezenas de prêmios ao redor do mundo. A magia sonora de dois gênios. Velhos vinis e CDs que pairam acima do tempo.
 
O show fez parte do Projeto Álbum, do Sesc Belenzinho, que propõe a recriação no palco de álbuns clássicos da música brasileira. Antes de pegar nos instrumentos, Gismonti contou a história do disco, gravado em Oslo, na Noruega, de forma improvisada. Convidado por um estúdio, ele viajava sozinho, mas dois dias antes da data marcada encontrou-se com Naná em Paris e propôs que vivessem juntos a aventura. 
Ana, Egberto e este escriba
 
“Não vai dar pra ensaiar”, respondeu Naná, depois de ouvir de Gismonti o que ele pretendia: “Levar um piano para dentro da mata e ouvir animais, rios, sentir a umidade, ver pântanos e clareiras.” Mais de 30 anos depois, lá estávamos nós, cercados por aquele mundo mágico.

OS CAMINHOS ATÉ LEONARD COHEN

Estrasburgo: uma das mais belas cidades da França

A bordo de um trem TGV francês, vejo passarem pela janela as belas paisagens da Alsácia. Estou a caminho de Estrasburgo, cidade sede do Parlamento Europeu, quase fronteira com a Alemanha. O trem é veloz, o dia está bonito, ligeiramente nublado, mas é impossível evitar uma certa ansiedade.  É manhã de sábado, véspera de realizar um antigo desejo: estar na platéia de um concerto de Leonard Cohen, um personagem quase lendário entre minhas admirações musicais.


Na bagagem, uma camisa de malha preta, em que mandei imprimir a frase “From Brazil to see Leonard Cohen in Strasbourg”, e dois ingressos, comprados quase por impulso, em 11 de fevereiro, pela internet. Naquela noite, soube pelo site “Leonard Cohen Files”, desenvolvido na Finlândia, maior fonte de informações sobre o compositor canadense, que os shows previstos para os primeiros meses deste ano haviam sido adiados para o segundo semestre. Por causa de dores na coluna, Cohen deveria se submeter a seis meses de fisioterapia. O adiamento me soou como um convite. Eu teria tempo de planejar a viagem. Com um simples clique no mouse, garanti meu lugar e tornei próximo um sonho distante.

O ticket: sete meses de espera

Na viagem de duas horas
entre Reims e Estrasburgo, penso em Leonard Cohen, suas histórias e lendas. Nascido em Montreal em 1934, Leonard dedicou-se à poesia desde muito jovem, para desespero de sua família, de origem judaica, que o pretendia um brilhante homem de negócios. Por não obter renda suficiente com os vários livros que publicou, decidiu fazer da música um veículo para seus belos e sensíveis poemas, e assim atingir um público maior. Passo a passo, chegou em 1968 ao primeiro disco, batizado apenas de Songs, ou canções. Tinha 34 anos quando estreou no mercado musical.

Hoje, é um dos últimos grandes ídolos que, surgidos nos anos 60, deram à música jovem um status que jamais tivera. Os Beatles, Bob Dylan, Lou Reed, Pink Floyd, Bob Marley e uma lista significativa de artistas transformaram um divertimento de adolescentes em veículo de reflexão, que propôs novos comportamentos e reinventou o mundo. A diferença entre Leonard Cohen e todos os outros é que Cohen começou apenas como poeta – como se fosse pouco.

Eu havia conhecido Cohen
com enorme atraso, na década de 80, quando um amigo, o jornalista João Alberto Ferreira, me deu um extraordinário presente de aniversário, o vinil I´m your man. A música título é uma de suas obras clássicas, mas o que me pegou pelo coração naquele álbum irretocável foi uma canção construída sobre um poema de Federico Garcia Lorca, Take this waltz, ou Pequena valsa vienense, título do poema original. 

Ao fundo, o Zenith

Com esse álbum,
Cohen começava a confrontar um mundo em desintegração, segundo sua própria leitura, o que se evidenciava na canção First we take Manhattan. O choque total veio no álbum seguinte, The future, em que sentenciava, logo na primeira faixa: “Prepare-se para o futuro, ele é assassino.”  A poesia de Cohen sempre abordou os conflitos humanos e sociais e a inútil busca da salvação, seja pelo amor, pelo sexo ou pelos caminhos religiosos. Mas parecia, com esse disco, ter chegado a um impasse. Logo em seguida, Cohen saiu de cena, e desapareceu por mais de 10 anos.

Desde 1993, Leonard Cohen não se apresentava em público. Passou cinco anos recluso no mosteiro budista de Mont Baldy, nos arredores de Los Angeles. Mas reapareceu em 2001, quando lançou o CD Ten new songs, em parceria com a cantora e compositora Sharon Robinson. Para Cohen, é um álbum de celebração. Talvez a redenção que foi buscar no mosteiro, onde escreveu as letras das canções. 

Doze mil fiéis súditos de Cohen

A turnê mundial iniciada
em 2008 é uma megaprodução, com uma superbanda, formada não apenas por artistas contratados para acompanhá-lo, mas músicos que são, acima de tudo, súditos a serviço de seu mestre. Esse grupo harmonioso tem se apresentado em espaços de alto prestígio, sempre lotados.  O Zenith de Estrasburgo, por fora, parece um ginásio de esportes. Por dentro, é uma casa de espetáculos de alto nível, com uma acústica inimaginável para os padrões brasileiros. Tem precisamente 12.079 lugares. Estava totalmente tomado por pessoas que foram não apenas ouvir Cohen, mas reverenciá-lo. 

Eu e meu amigo inglês

Um público enorme,
mas nenhum sinal de tumulto, nenhuma fila, nenhum estresse. Uma hora antes, os portões estão abertos, as pessoas aos poucos vão tomando o hall que cerca as entradas da platéia. Há alguns bares e quiosques onde são vendidos CDs, livros e camisetas. Minha camisa de brasileiro exótico chama a atenção. Algumas garotas pedem para tirar fotos comigo. Já na platéia, eu e minha esposa, Nádia, explicamos a um grupo de ingleses que Leonard Cohen nunca esteve no Brasil, onde tem um público sofisticado e reverente, mas supostamente pequeno.

O concerto vai começar. Os músicos assumem seus lugares e tocam os primeiros acordes de Dance me to the end of love. Vemos apenas seus perfis, no palco em penumbra. Então, a intensidade da luz aumenta e Cohen entra correndo, com um largo sorriso. Traja um terno bem cortado e o mesmo chapéu que o acompanha nos últimos anos. Está a dois dias de completar 76 anos. Quando sua voz inconfundivelmente grave se projeta e hipnotiza o público, sinto que vivo um momento especial. Aquelas horas vividas ali na platéia do Zenith ficarão congeladas no tempo. 

Cohen, com as Webb Sisters ao fundo: emoção

As canções mais emblemáticas
de Cohen, que tive o privilégio de ouvir como se ele as cantasse para mim, fizeram de seus discos verdadeiras obras primas. Suzanne, Famous blue raincoat, Sisters of mercy, Hallelujah são algumas delas. Bird on the wire é uma espécie de projeto de vida de Leonard. “Como um pássaro no fio, como um bêbado numa cantoria noturna, vou buscando meu jeito de ser livre”, diz a letra. Cohen cita um conhecido verso dos Beatles antes de cantá-la: “Dizem que tudo que precisamos é amor, mas penso que é liberdade”, diz ele. Nessas alturas, já está difícil conter as lágrimas.

Cohen disse certa vez
ao jornalista Mikal Gilmore, da revista Rolling Stone, que encontrou na arte conforto e força – “ao fazer canções, muito da dor da minha vida se dissolvia.” É este Leonard Cohen que vemos ao longo de quase três horas de concerto, cantando de olhos fechados, muitas vezes de joelhos, prestando total reverência a cada palavra com que construiu seus poemas e às belas melodias com que os vestiu. Creio que aqui reside minha maior identificação com Leonard Cohen, a crença de que a poesia é a cura para os males da vida. 


A música a serviço da poesia

Cohen canta em estado de êxtase,
trocando reverências com os músicos, que parecem tão deslumbrados quanto o público. Ao apresentá-los – o produtor musical e baixista Roscoe Beck, o tecladista Neil Larsen, os guitarristas Javier Mas e Bob Metzger, o baterista Rafael Gayol, o saxofonista Dino Soldo e as vocalistas Hattie e Charley, as Webb Sisters – Cohen compõe um poema para cada um. Quando um deles apresenta um solo, Cohen tira o chapéu, segura-o junto ao peito e ouve atentamente.

A maior parte deles trabalha com Cohen há décadas. “Podemos jogar pela janela tudo que sabemos sobre música, porque o importante é interpretar as letras de Leonard”, afirma Metzger, no documentário Songs from the road, recém-lançado. O espírito da turnê é revelado pelo produtor Rob Hallett: “Não estamos tentando vender nada, nem quebrar recordes... apenas promover encontros entre Cohen e seus fãs.”

“Não sei quando voltaremos, mas estejam certos que eu e os músicos damos o melhor de nós”, diz Leonard. Os dois telões, ao lado do palco, mostram closes dele e dos músicos, e todas as canções são legendadas em francês. A música mais aplaudida, The partisan, fala de um personagem da resistência francesa, formada por civis que tentavam sabotar a dominação alemã durante a segunda guerra mundial. 


Leonard Cohen, canções para sempre na memória

Iniciado às 20h20,
o concerto só termina às 23h30. No bis, Cohen canta mais seis canções, até que o público se acalma e cessa de chamá-lo de volta. Uma dessas canções – If it be your will – ele apenas declama, passando a tarefa de cantar para as vocalistas Webb Sisters. Outro momento de emoção. Cohen tira novamente o chapéu e fecha os olhos. No final, entrega a elas um buquê de flores que alguém colocou no palco. Cohen é o mesmo cavalheiro cortês de sempre, agora de cabelos grisalhos e rosto vincado. O tempo passa e o concerto chega ao fim, mas as canções permanecem no ouvido, no cérebro, no coração. Dou uma última olhada para o palco, já vazio, antes de sair. Eu sei que, sempre que ouvir de novo aquelas canções, estarei de volta a Estrasburgo. 


Esta crônica foi publicada no Correio Braziliense, Caderno Pensar, em 23/10/2010

A PROFECIA DE SÁ, RODRIX & GUARABYRA

Gravado no segundo semestre de 2008, o CD Amanhã, de Sá, Rodrix e Guarabyra só foi lançado em fevereiro de 2010, quase um ano após a morte de Zé Rodrix. O CD traz 12 canções inéditas do trio, mas a faixa que mais chama a atenção é Novo Rio, uma profecia, carregada de lirismo, da tragédia que assolou o Rio de Janeiro nos últimos dias. Clique para ouvir.

ESTRANHOS

O compositor Octávio Scapin faz neste domingo, 4 de outubro, em Goiânia, show de lançamento de seu CD Nunca converse com estranhos. Será no Cine Goiânia Ouro, às 20h. Octávio Scapin vem construindo uma obra musical muito interessante, com melodias elaboradas e letras que fogem ao lugar comum. Por isso, é bom prestar atenção no seu trabalho: quem não estiver em Goiânia pode conhecer algumas canções do novo CD pelo MySpace. Este escriba participa do CD com dois poemas que Octávio musicou. Está em ótima companhia.

CORAÇÃO VAGABUNDO

O tempo trouxe maturidade e levou embora um tanto daquela arrogância que Caetano Veloso parecia gostar de exibir. Mas o gênio, o olhar aguçado, a sensibilidade e a capacidade de observação continuam afiados, a julgar pelo que se vê no documentário Coração Vagabundo, lançado nacionalmente no final de julho e ainda circulando pelos cinemas do Brasil.

O filme de Fernando Grostein Andrade
mostra momentos de intimidade do músico baiano durante turnês de lançamento do CD Foreign Sounds, em shows realizados em São Paulo e cidades dos Estados Unidos e do Japão (2003-2005). Chega a ser estranho ouvir Caetano falar de suas dificuldades com a língua inglesa ao enfrentar uma entrevista na televisão norte-americana. “Eu sou de Santo Amaro, e lá vivi até os 18 anos”, afirma ele. “Não sou de São Paulo, uma cidade com espírito cosmopolita.” Não é qualquer baiano que encara aquela gororoba japonesa que Caetano se esforça para provar, na cena mais hilária do filme.


Ao mesmo tempo, é emocionante
ver Caetano Veloso interpretar, em plena forma, clássicos do jazz ou os seus próprios, com destaque para Terra, uma das mais belas canções feitas no Brasil desde que o Festival da Record revelou o músico. E as manifestações de fãs ilustres, como o cineasta Pedro Almodóvar e o cantor David Byrne, só reforçam a experiência dos brasileiros privilegiados que acompanham sua carreira. Coisa que estrangeiros anônimos também aprenderam a fazer, como o monge que se declara fã, ou os japoneses que contorcem a língua para entoar trechos de suas canções.


Outro momento marcante do filme
é a rápida aparição do cineasta Michelangelo Antonioni, homenageado por Caetano com uma bela canção. Antonioni revê num computador um de seus grandes momentos no cinema, a cena final de Passageiro profissão repórter, enquanto conversa com a esposa sobre o músico brasileiro.


O documentário também mostra
que a produtora do filme, Paula Lavigne, ex-mulher de Caetano, é aquilo que sempre foi: uma chata. Na época, o casal estava em processo de separação e Caetano demonstra, em algumas passagens, não viver bom momento emocional. Agora que Caetano Veloso está livre de Paula Lavigne, quem sabe volte a criar um grande disco, como os que fez nos anos 70 e 80? Ao mostrar o grande artista que ele é, o filme nos reacende a esperança.

BOB DYLAN CHEGA PARA O NATAL


O cantor e compositor Bob Dylan lança em outubro um álbum de canções natalinas, Christmas in the heart. A notícia soa como algo inusitado mesmo na biografia de um artista em permanente estado de mutação, até que se expliquem algumas coisas.

Dylan vai doar todos os royalties sobre as vendas dessas gravações nos Estados Unidos para a ONG Feeding America, garantindo, somente nos feriados da virada do ano, mais de 4 milhões de refeições para 1,4 milhão de pessoas que passam necessidades naquele país. Além disso, ele contribuirá com duas entidades internacionais para atender milhões de pessoas carentes no Reino Unido e no mundo em desenvolvimento, e doará perpetuamente todos os royalties das vendas internacionais do álbum para essas entidades.

Para Dylan, "é uma tragédia que mais de 35 milhões de pessoas, somente neste país, sendo 12 milhões de crianças, vão para a cama com fome e acordem cada manhã sem saber onde será sua próxima refeição". Se na "terra da fartura" é assim, imagine aqui no sul do mundo...

A extensa obra de Bob Dylan rejeita rótulos. No entanto, suas canções de denúncia e protesto, que se tornaram clássicos, valem como contribuição para um mundo melhor. Afinal, é este o papel do artista: tocar nas feridas. Mas Dylan sabe que os podres poderes têm ouvidos moucos.

OUVIR LEONARD COHEN

Assim como o amor depende de uma química que envolve todos os sentidos, também a música provoca uma reação em nossos neurônios, causando reflexos nos batimentos cardíacos. Como explicar esse poder que a música e seus elementos - melodia, ritmo, palavras - exerce sobre nossas estruturas físicas e psíquicas?

Não explique - mergulhe. Por exemplo, ouça Leonard Cohen. Entregue-se às canções desse bardo canadense, que completa 75 anos em setembro e tem se apresentado nos Estados Unidos e Europa com um megashow de quase três horas de duração, gravado neste precioso CD recém-lançado no Brasil - "Live in London".

Deixe-se envolver por essa música inexplicável, moldada por poemas de grande intensidade, cantados, quase declamados, por sua voz ao mesmo tempo áspera e doce, que você nunca vai se cansar de ouvir.

O ÚLTIMO SHOW DE ZÉ RODRIX

A TV Brasil, conhecida por aí como "a TV do Lula", apresentou ontem, quarta-feira, 27, no programa Cena Musical, o que teria sido o último show gravado pelo músico Zé Rodrix, que morreu no dia 22. Ao lado de seus parceiros Sá e Guarabyra, Rodrix interpretou os eternos sucessos do trio, agora que está para ser lançado um novo CD de canções inéditas do grupo. O show gravado pela emissora incluía trechos de entrevistas dos músicos. Foi emocionante. O ponto fraco do programa é a péssima qualidade sonora da TV Brasil. Parece que o dinheiro público investido no equipamento da emissora foi insuficiente... Ou será que uma parte dos recursos tomou outros destinos?