BONS TEMPOS AQUELES

Trabalhei na sucursal de Brasília do Jornal do Brasil entre 1985 e 1988, e considero esse período a mais importante experiência da minha vida profissional. O JB, apesar da fama de empresa eternamente endividada, era um dos quatro grandes da imprensa nacional, e na opinião da maioria dos jornalistas, o melhor de todos. Ali estava o jornalismo mais criativo, o melhor texto, as reportagens mais originais.

Hoje, 31 de agosto de 2010, circula pela última vez a edição impressa do Jornal do Brasil, fundado há 119 anos e mergulhado numa dívida de R$ 800 milhões. As últimas edições tiveram tiragem de 30 mil exemplares, segundo o próprio jornal, que, nos anos 60, chegou a tirar 230 mil exemplares aos domingos. A partir de agora, o JB será lido apenas na internet, em "nova e melhor fase", anunciada por um editorial que enaltece o "primeiro jornal 100% digital"...

Em meados dos anos 80, quando a redação brasiliense tinha uns 30 jornalistas, os grandes jornais brasileiros adotavam a impressão offset, com fotos a cores e importantes mudanças gráficas. Só o JB, primo pobre, continuava com o anacrônico sistema leterpress, pouco mais evoluído que a tipografia. As fotos, sempre em preto-e-branco, tinham baixa nitidez, o que não tolhia o talento dos fotógrafos.

Ricardo Noblat era o editor executivo da sucursal, dirigida por Luiz Orlando Carneiro. O braço direito de Noblat era João Santana, um talentoso ex-poeta, que no passado era conhecido como Patinhas e escrevia belas letras para as canções da banda baiana Bendegó. Hoje ele abandonou também o jornalismo e transformou-se em vendedor de ilusões... Que evolução!

O lendário colunista político Carlos Castelo Branco publicava todos os dias na página dois, e eventualmente aparecia na redação para entregar sua coluna datilografada. Luiz Orlando raramente saía de sua sala, afastada da redação, mas de vez em quando aparecia para um comentário interessante, um papo rápido com os repórteres presentes. Além de jornalista, Luiz Orlando é um dos maiores especialistas brasileiros em jazz, essa forma elevada de música, e desenhista diletante. Dois de seus desenhos a crayon, de temática jazzística, decoram uma parede de meu apartamento.

"Jornalista trabalha melhor sob tensão", ensinava Noblat, que atribuía a si essa nobre missão - estressar os repórteres. Contam as lendas da época que todos os jornalistas da redação mantinham agenda semanal com a mesma psicanalista. Ao chegar um novato, ela advertia: "Fale-me de sua mãe, porque do Noblat eu já sei tudo."

Bons tempos aqueles. Acho que estou ficando velho. Não há mais JB nas bancas e tenho cada vez mais histórias para contar. 

INCLUSÃO CULTURAL

O escritor e jornalista Wilson Rossato teve a idéia de escrever o livro O sonho de Fernão - Uma aventura com Fernão Dias Paes ao descobrir que é descendente do bandeirante. Com essa obra, voltada para o público infanto-juvenil, Rossato dá prosseguimento a um interessante projeto, o de contribuir para a inclusão cultural de jovens carentes. Ao vender o exemplar ao preço simbólico de R$ 1,00, ele permite que os estudantes das escolas que visita adquiram o livro, e estimula a leitura ao conversar com eles sobre seu trabalho. Para os leitores tradicionais, Rossato lança o livro na próxima quinta-feira, 26, a partir das 19h, no Açougue Cultural T-Bone (312 norte). A eles o livro também é vendido a R$ 1,00, mas Rossato sugere que quem puder pague um pouco mais, levando apenas um exemplar, contribuindo, assim, para a distribuição de mais volumes. O projeto de inclusão cultural promovido por Rossato começou em 2008, com o livro O DJ e as armas proibidas. Total apoio ao Wilson. 
 

A REINVENÇÃO DO ESCRITOR

Jornalista e crítico literário, Sérgio de Sá lança nesta terça-feira, 24, no Restaurante Carpe Diem (104 sul), A reinvenção do escritor: literatura e mass media. O livro, publicado pela Editora da UFMG, analisa as conexões entre a vida literária latino-americana e seu contexto histórico e social, e questiona o papel da literatura e do escritor no mundo urbano. Sérgio de Sá tem tido importante participação no movimento literário de Brasília.

MARCELO SAHEA EM BRASÍLIA

O poeta Marcelo Sahea volta a Brasília para apresentar sua performance poética intermídia e lançar seu novo livro, Nada a dizer - além, é claro, de rever os velhos amigos e incorporar os novos.

Vamos encontrá-lo na Galeria Objeto Encontrado (102 Norte, Bloco B, Loja 56, Asa Norte), a partir das 19h, na próxima terça-feira, 24.

Sahea é diretor de arte, além de artista visual e sonoro, e participou de exposições coletivas como a Obranome II, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio, no ano passado, e na I Bienal Internacional de Poesia de Brasília, em 2008. No mesmo ano fez uma individual na Mostra Sesc de Artes, em São Paulo.

Artista inquieto e criativo, Sahea tem investido em performances poéticas que reúnem palavras a sonoridades diversas. Em seus livros, utilizando conhecimentos de artes gráficas e as possibilidades ilimitadas da informática, ele desenvolve um trabalho absolutamente pessoal. Será uma bela experiência comparecer e ver o que ele nos reserva.
 

DESENVOLVIMENTISMO DESTRUIDOR


Esta foto, feita por Wilson Pedrosa e publicada no jornal O Estado de S. Paulo desta quinta-feira, 19, ilustra com perfeição o tipo de desenvolvimento proposto pelo bando de Dilma Rousseff e seu partido e que a mim, como eleitor, não interessa. Ela mostra o avanço da Ferrovia Transnordestina, como um tanque de guerra, sobre a histórica igreja de São Luiz Gonzaga, no povoado de Fazendinha, sertão de Moxotó, Pernambuco.
 
A igreja, de acordo com reportagem de Leonêncio Nossa, é um raro símbolo do Brasil Colônia, encravado na caatinga desde o século 18. Antes de chegar às proximidades da igrejinha, as máquinas sedentas do desenvolvimentismo a todo custo passaram por cima de velhas baraúnas, também cultuadas pelas cerca de 200 famílias descendentes de africanos e portugueses, que vivem no local.

Há um livro que conta a história do povoado e da igreja, e cita os ancestrais dos nativos enterrados dentro da igreja, alguns deles personagens históricos. Uma equipe de arqueólogos contratados pela Odebrecht já andou revirando as ossadas.

Muitos dos nativos vivem da bolsa-família, mas todos sabem do óbvio: a ferrovia passará pelo povoado como um bólido, sem deixar qualquer benefício. Os políticos locais estão em cima do muro, preocupados apenas com votos a ganhar ou a perder. E a ferrovia, que poderia muito bem fazer uma volta ao redor do sítio histórico, aguarda apenas a destruição de mais um de nossos bens culturais para seguir em frente.


[Foto: Wilson Pedrosa, Agência Estado]

NOVOS POEMAS DE ANDERSON HORTA

  O poeta Anderson Braga Horta (à esquerda, na foto) lançou em Brasília, na última quarta-feira, 4, seu livro Signo - Antologia Metapoética. No livro, o poeta conta um pouco da história da poesia por meio de seus próprios poemas, criados ao longo de décadas e fiéis a diferentes estilos e vanguardas. O livro foi publicado pela Thesaurus Editora, de Brasília, e lançado no restaurante Carpe Diem. 

 Mineiro de Carangola, Anderson Braga Horta vive desde 1960 em Brasília, e sua presença enriquece o meio literário da cidade. Não apenas pelo grande poeta que é, como também pela amizade e prestatividade. Quando publiquei o livro Poemas por amor, reunindo versos dedicados a minha companheira, Nádia (a meu lado na foto), Anderson escreveu um belo texto de apresentação, publicado na contracapa, em que ficava evidente sua sensibilidade de leitor. 

Na primeira foto, aparece também o tradutor e poeta Jeronymo Rivera (à direita).

COMEÇA A FLIP


Montagem da Tenda dos Autores
Foto: Flip Festa Literária (Flickr)
Começa nesta quarta-feira, 4 de agosto, a Festa Literária Internacional de Paraty. Na mesa de abertura do evento, o sociólogo e professor universitário Fernando Henrique Cardoso, autor do prefácio da edição mais recente de Casa-grande & Senzala e um dos principais estudiosos de Gilberto Freire no Brasil, fala sobre a obra do intelectual pernambucano.

O anúncio da presença de Fernando Henrique, ex-presidente do Brasil, na Flip, foi suficiente para despertar algumas polêmicas, especialmente entre petistas exacerbados, que saíram por aí perguntando se a Flip "tucanou". Ora, FHC é sociólogo, professor universitário e especialista na obra de Freire... O que há de errado, então, em convidá-lo para falar a respeito, e na mesa de abertura, já que Freire é o homenageado oficial da festa?

Mais estranho seria convidar o atual presidente, Lula da Silva, para falar sobre qualquer coisa.

Há outras polêmicas sobre a Flip rolando na imprensa. Uma delas é o pequeno número de escritores ficcionistas, numa festa que se propõe literária, privilegiando ensaístas.

Faz sentido. Mas é importante lembrar que a Flip, hoje o mais badalado evento literário do Brasil, é na verdade um evento comercial, comandado pelas grandes editoras. A Flip é realizada pela Associação Casa Azul, uma Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) criada com o objetivo de contribuir para a solução dos problemas de infraestrutura urbana de Paraty, informa a página oficial do evento na internet. 

Paraty é cidade turística. Realizar na cidade uma festa literária, reunindo escritores de nome internacional, com o patrocínio de grandes empresas e dos governos federal e estadual, só poderia dar certo. Além de levar à cidade turistas interessados em ouvir palestras durante duas horas do dia, e depois badalar pelas charmosas ruas da cidade, a Flip também atrai aquele tipo de turista endinheirado que vai aonde a badalação está, não importa em função de quê. 

Escritores "não oficiais" que comparecem a Paraty apenas para aproveitar o clima e exibir e vender seus livros nas ruas não são bem-vindos à cidade. Nos últimos anos, houve casos de apreensão de livros e repressão policial. 

A partir desta oitava edição, a preocupação dos organizadores passa a ser uma forma de impedir o contínuo crescimento da festa, que a cidade parece já não comportar.