[história afetiva] PROTÓTIPO Nº 6

“Grupo formado em Passos com o objetivo de mostrar ao resto do país a sua literatura e divulgar outros novos autores que surgem sem chances de publicar seus trabalhos” – assim se definia o Grupoema, nome com que os fundadores da revista literária Protótipo se apresentavam. Criada no interior de Minas Gerais, a revista já tinha a pretensão de ensaiar voos mais altos. A sexta edição da Protótipo foi lançada em novembro de 1973, apenas 11 meses depois de seu número de estreia. A partir daí, veio um longo intervalo de dois anos.

O comércio da cidade de Passos continuava prestando todo o apoio à revista, como acontecia desde o primeiro número. No entanto, a dispersão do grupo inviabilizou a continuidade da publicação. No início de 1974, a maior parte dos seus integrantes, jovens entre 17 e 21 anos, se mudaram para outros centros, com o objetivo de prosseguir seus estudos. O destino da maioria era Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro ou Brasília.

A sexta edição, com capa de Antônio Barreto, representou a despedida da primeira fase, mas, ao menos para alguns dos integrantes do grupo, não foi o fim de um sonho. A literatura permaneceu forte como atividade ou projeto de vida. Era uma semente incubada, que renasceria no futuro.

Entre os autores publicados nesta edição, além daqueles que já frequentavam suas páginas desde o primeiro número, é interessante citar a presença de Afonso Henriques Neto, nome importante do grupo carioca do movimento da poesia marginal, filho e neto de importantes poetas brasileiros. Mas participaram também Romes Aziz Sabbag (Guaxupé-MG), Gilberto Andrade Abreu (Passos), Irene Tavares (São Paulo), Julio Cesar Nery Ferreira (Belo Horizonte), Duneya West e Sandra Siqueira (Rio de Janeiro),  Ricardo Costa Vaz (Formiga-MG) e Paulo Nassar de Oliveira (Londrina-PR).


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[estante afetiva] A VIAGEM DAS PALAVRAS

 Durante uma viagem de avião, entre Brasília e São Paulo, eu soube que meu amigo, xará e conterrâneo Alexandre Brandão transou com a Gisele Bündchen.

O Xará é escritor, o que talvez o credencie a mentir, de forma não condenável. Escritores fingem completamente, como disse Fernando Pessoa, mas é outra a mentira que contam: afinal, uma das fontes da força da literatura é que cada mentira, cada fantasia, remete à realidade.

O ofício do escritor não é nada simples – não é feito de colocar palavras umas atrás de outras, mas de saber usar a palavra certa no lugar certo, o que é muito diferente. As palavras são como pedras de infinitas faces, e cada face tem um sentido e uma sutileza, o que torna a construção do texto uma função de ourives. É por isso que acreditei na história contada pelo Alexandre Brandão, embora a creia improvável, talvez não a transa em si, mas os diversos contextos.

Quem ler o livro No Osso – Crônicas Selecionadas, publicado pela Cais Pharoux, vai deparar com histórias em que Brandão revela suas várias faces de ourives da palavra. Há memória, fantasia, ficção, história e textos em que o autor simplesmente brinca com as palavras, como uma criança brinca com pedras, pedaços de ossos ou frutos verdes caídos das árvores. Escrever é, no mínimo, muito divertido, assim como ler o resultado dessas brincadeiras.

Mas o trabalho de Alexandre Brandão é muito sério – e aí talvez seja melhor tratar sua literatura não como uma brincadeira, mas como um jogo. Logo na primeira crônica, O mundinho das palavras, ele mostra de que essas pecinhas mágicas são capazes quando manipuladas por um bom artesão. Só faltou perguntar, no final, se delirium verbis é doença de escritor.

O livro traz 45 crônicas, escritas a partir de 2000. Parte delas foi publicada em jornais e blogs, especialmente o blog No Osso, que Brandão mantém há alguns anos e que emprestou o nome ao volume. Algumas referem-se à cidade de Passos, cenário de sua infância, mas alcançarão qualquer leitor sensível. Em outras, o autor exercita seus dons e imaginação de contista, em textos que pegam o leitor pelos sentidos e o conduzem sem turbulências até o final do livro, quando se percebe que a viagem foi rápida e prazerosa.