Poemas por amor

Abra-se este livro com reverência:
são poemas de amor da mais comovente delicadeza.
Queria comentá-los com o leitor,
mas percebo que não é preciso, nem seria conveniente.
Este livro fala e se diz por si mesmo,
em versos de um amor além do tempo e do espaço,
mão do Poeta levemente pousada
no ombro da Amada.
Ah! o poema que se esconde nos olhos dela,
as palavras aninhadas ao redor de seu silêncio
luminoso!
Este é o livro do amor que desaprende a língua dos homens
para que o trôpego coração diga as palavras
impronunciáveis.
A nós, leitores, a graça de ouvi-las
e entendê-las.

Texto de Anderson Braga Horta
para a contracapa de meu livro
Poemas por amor,
saindo do forno.

A biblioteca do futuro [2]

O jornalista Mário Salimon participou da 14a. Reunião Interamericana de Bibliotecários, Documentaristas e Profissionais da Informação, na Universidade Autônoma do México, em 2006. A tônica das discussões foi o valor das bibliotecas no futuro. Salimon conta que as principais conclusões foram as seguintes:
1) Biblioteca tem que ter livros. Os repositórios organizados de arquivos digitais, que incluem áudio, fotografia e vídeo, são Infotecas;
2) os profissionais das bibliotecas devem sair da postura passiva de esperar que alguém os procure para buscar formas de compilar referências condizentes com as necessidades estratégicas da sociedade;
3) As pessoas, incluindo os acadêmicos, estão se acostumando a buscar informação no Google sem maior preocupação com validade e consistência do material encontrado.

O escritor Ezio Flavio Bazzo aproveitou para reclamar da redução do horário de funcionamento da Biblioteca Demonstrativa de Brasília, estabelecida por "ordens superiores", segundo ele - medida publicada no Diário Oficial. Ezio observa que o Ministério da Cultura deveria formular políticas públicas de incentivo à leitura e abertura de bibliotecas, viabilizando seu funcionamento 24 horas por dia. A Biblioteca do Congresso argentino, compara ele, fica aberta até de madrugada e ainda serve sopas para os mendigos.

Pois é, nenhum sinal de civilização à vista.

A biblioteca do futuro

Em entrevista à Rádio CBN (terça, 16), o novo secretário de Cultura do DF, Silvestre Gorgulho, declarou que pretende fazer da Biblioteca Nacional de Brasília a "biblioteca do Século XXI". Para quem não sabe, a citada biblioteca, recentemente inaugurada sem qualquer livro em seu interior, compõe, ao lado do Museu, o conjunto Cultural da República.

Mas o que seria a "biblioteca do Século XXI"? O próprio secretário explicou que é aquela em que os livros de papel não são tão necessários, e que o importante é o acervo digitalizado. Bem, foi uma explicação lacônica, e este escriba, que ouvia atentamente a entrevista, também achou que entendera mal.

Brasília tem 20 bibliotecas públicas administradas pelo Governo local, espalhadas pelo Plano Piloto e cidades satélites. Assim como a grande maioria das bibliotecas brasileiras, elas estão muito mais próximas da Idade Média que do Século XXI (no qual, é bom lembrar, já estamos vivendo). Logo, estão atrasadíssimas, assim como a Biblioteca Nacional de Brasília, que começou muito mal, pois foi construída sem qualquer planejamento para o seu acervo.

O secretário de Cultura, jornalista e ambientalista respeitado, não deve ter freqüentado muitas bibliotecas em sua vida, até porque o poder público brasileiro nunca entendeu o verdadeiro valor de uma boa biblioteca, artigo em falta no País. Gorgulho deve acreditar, assim como acreditam alguns profetas do apocalipse, que o livro de papel está condenado ao fim, e o futuro pertence ao livro eletrônico.

Os estudiosos do assunto não concordam. Nem os escritores, nem os pesquisadores, nem os grandes leitores. Não vou citá-los para não trazer essa discussão para este texto, que não é o caso. O livro é um objeto vivo, e o suporte papel mantém com o leitor um vínculo sensorial, que as luzes frias da tela do computador jamais substituirão. Folhear um livro antes ou durante a leitura, correr os olhos pelo texto impresso no papel, segurar o livro e virar uma página são atividades insubstituíveis pela tecnologia eletrônica.

Portanto, uma biblioteca de verdade é composta de livros de papel, sejam os livros novos, as obras raras, os periódicos, documentos diversos. Isso é História. O arquivo eletrônico não tem essa capacidade de registrar a História, porque é virtual, fugaz, efêmero.

Para que a Biblioteca Nacional de Brasília se transforme na biblioteca do Século XXI, deve ser administrada como nenhuma biblioteca do DF jamais foi, e possivelmente nenhuma biblioteca pública brasileira. Deve ser planejada, catalogada, enriquecida diariamente com livros e documentos. Deve ter, por exemplo, publicações históricas, que contem a história do Brasil, a história da cidade, em mínimos detalhes; deve estabelecer critérios racionais de atualização do acervo, de forma que receba todos os livros publicados no País, ou pelo menos grande parte deles; deve ter uma seção de obras raras; uma seção de publicações que dêem uma idéia da formação cultural de Brasília, mas também do Brasil. Deve ter uma coleção de todos os jornais que já foram publicados em Brasília desde a inauguração da cidade, e se isso não for possível, aí sim, os arquivos eletrônicos serão fundamentais.

E todo esse material deve ser enriquecido permanentemente, e cuidadosamente catalogado e administrado. O leitor deve ter acesso a cada novo livro divulgado pela imprensa, e para isso o órgão administrador não deve mendigá-lo à editora; deve comprá-lo, ainda que por um preço especial.

Além de tudo isso, é claro, a Biblioteca deverá possuir espaços adequados e confortáveis para leitura e estudo, suficientes para um grande público. Deve ter, sim, computadores ligados à internet, com conexão rápida, e ligados também a seu acervo digital.

Mas como será a aquisição desse acervo? Esta é a grande pergunta que ninguém respondeu, e foi lançada inúmeras vezes, desde que se lançou também a pedra fundamental da obra. Então, que o secretário a responda. O Depósito Legal, que recolhe exemplares de todos os livros publicados no Brasil, funciona para a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Para funcionar também para a nossa, teria que haver uma nova lei, ou uma alteração na atual. E no entanto, resolveria o problema das publicações futuras, mas não as do passado. E os periódicos? E os documentos históricos?

Seria interessante colocar o tema em discussão em Brasília. Para você, o que seria a "Biblioteca do Século XXI"? Pensemos sobre o assunto.