"À palavra deu a natureza por origem a cabeça da áspera artéria, o ar por corpo, a língua por mãe, e a boca por berço, mas com tão instantâneo descanso que apenas nascida voa, e com tão breve vida, que logo nos ouvidos dos circunstantes se sepulta. Porém não acaba a palavra quando morre, porque ainda que metida na tortuosa sepultura do ouvido, com o osso petroso por campa, e com várias membranas por mortalhas, e quase perdida nos ocultos meatos da parte que os Anatomistas chamam de Labirinto, alentada com o impulso e comoção do ar implantado, acha a palavra abertas as válvulas, ou pequenas portas, por onde passam as espécies de som para o nervo auditório, e dele para os ventrículos do cérebro, onde estão depositados os tesouros da memória; e por este modo fica a palavra na impressão da sua própria espécie, epitáfio de si mesma, sombra da voz e cadáver da locução, até que chegue a lograr outra vida, quando, suscitada da reminiscência, torna a sair da boca ou da pena dos Escritores, e sucessivamente atada a outras com o fio do discurso, participa, com a doutrina dos sábios, nas obras da eloqüência."
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