A festa é intensa, o motivo justo: celebrar a literatura e aqueles que lhe dão sentido, escritores e leitores. O cenário é um sonho, não poderia ser mais literário; Paraty, cidade histórica do litoral fluminense. Sua população, de menos de 30 mil pessoas, recebeu cerca de 20 mil visitantes entre 2 e 6 de julho, e ainda conseguiu ser hospitaleira. Mas, ainda que tomada por essa multidão, a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), em sua sexta edição, continuou elitista. Julgue-se pelos altos preços de todos os serviços, incluindo os da própria Flip, a começar pelos R$ 25,00 do ingresso de cada palestra. E quem pagou R$ 25,00 pelo show de abertura, com Luís Melodia, deve ter se arrependido, pois quem não pagou viu do mesmo jeito, só que do lado de fora da cerca.
Não faltaram turistas estrangeiros, que puderam entrar em contato com algo que muitos deles adoram – a vocação brasileira para a esculhambação. O anfiteatro montado para o público permanecia fechado até o momento marcado para o início das palestras, e a fila crescia lá fora. Depois, privilegiados e “acompanhantes” entravam na frente e ocupavam os melhores lugares. Os convidados estrangeiros apresentavam-se com seriedade, mas alguns brasileiros pareciam ter sido convocados à última hora para participar de algo que nem sabiam direito o quê era. Foi o caso do crítico de arte Rodrigo Naves, que caiu de pára-quedas em meio ao evento. “Tenho 53 anos e só publiquei um pequeno livro de contos”, disse ele. “Não sei se sou escritor, isso não é uma coisa bem resolvida para mim.” Participante da mesa “Formas Breves”, com o brasileiro Modesto Carone e o alemão Ingo Schulze, parecia tonto. Modesto Carone tentou improvisar uma pergunta para Schulze que ninguém entendeu. Restou ao público ouvir o alemão narrar suas experiências de escritor nascido na Alemanha Comunista, testemunha da queda do Muro de Berlim.
Uma das pérolas da esculhambação foi proporcionada por Carlos Augusto Calil, mediador da mesa que reuniu Schulze, Carone e Naves. “Formas breves”, definiu ele, “são aqueles textos curtos, ideais para quem não tem tempo a perder com literatura e abre brechas no seu tempo para leituras rápidas.” Sem comentários...
Não foi o único caso de mediador que tentou aparecer mais do que os palestrantes. Manuel da Costa Pinto chegou a ouvir protestos do público, na mesa que teve os italianos Alessandro Baricco e Contardo Calligaris. Ángel Gurria-Quintana por várias vezes tentou impedir o colombiano Fernando Vallejo de disparar sua verve polêmica, na mesa que promoveu seu encontro com o holandês Cees Noteboom.
A sexta edição da Flip contou com novo diretor de programação, Flávio Moura, que não se deu ao trabalho de trazer qualquer poeta para a festa. Literatura, para ele, parece ser apenas ficção. Houve muita badalação, elogios, aquelas coisas. Representantes das principais editoras brasileiras estavam lá, talvez para conferir se os nomes que indicaram participaram de fato. Era o caso da Companhia das Letras e da Cosac-Naify, entre os patrocinadores da festa. Assim como a Folha de S. Paulo, cujos colunistas, cada um mais chato que o outro, ocuparam várias mesas.
Mas a Flip não frustrou o público. O crítico e ensaísta Roberto Schwarckz fez a abertura da festa com uma brilhante conferência sobre o homenageado deste ano, Machado de Assis. Ele mostrou que a obra do escritor nada tem de conservadora. Ao contrário, Machado era um crítico da sociedade de seu tempo, que tentava convertê-lo em seu aliado, e somente após a descoberta de sua obra por estudiosos estrangeiros ele pôde ser melhor compreendido em sua terra.
A psicanalista francesa Elizabeth Roudinesco fez uma interessante palestra sobre a perversão, com base em livro publicado recentemente, que aborda o comportamento doentio de personagens clássicos da literatura, como Dorian Grey, do livro de Oscar Wilde. O escritor colombiano Fernando Vallejo, polêmico e irônico, previu que a palavra “fome” será banida dos dicionários brasileiros pelo “seu presidente, gordinho e contente” e distribuiu farpas a suas costumeiras vítimas – o papa, a Colômbia, etc, etc. O holandês Cees Noteboom falou de suas viagens ao redor do mundo, de onde retira a riqueza de seus personagens.
Houve outros autores dignos de nota, mas também é preciso falar do casario de Paraty, da paisagem, da Serra do Mar, de sua gente simpática, do Teatro de Bonecos, do Armazém da Cachaça, do Bombom da Maga, do restaurante Banana da Terra e seus pratos feitos com esmero, da moqueca vegetariana do Arpoador e do restaurante Grão da Terra e sua deliciosa cozinha vegetariana, grande descoberta. E dos passeios às praias do Sono e de Trindade. A Flip foi uma experiência proveitosa. Paraty é sempre um convite à volta.
Não faltaram turistas estrangeiros, que puderam entrar em contato com algo que muitos deles adoram – a vocação brasileira para a esculhambação. O anfiteatro montado para o público permanecia fechado até o momento marcado para o início das palestras, e a fila crescia lá fora. Depois, privilegiados e “acompanhantes” entravam na frente e ocupavam os melhores lugares. Os convidados estrangeiros apresentavam-se com seriedade, mas alguns brasileiros pareciam ter sido convocados à última hora para participar de algo que nem sabiam direito o quê era. Foi o caso do crítico de arte Rodrigo Naves, que caiu de pára-quedas em meio ao evento. “Tenho 53 anos e só publiquei um pequeno livro de contos”, disse ele. “Não sei se sou escritor, isso não é uma coisa bem resolvida para mim.” Participante da mesa “Formas Breves”, com o brasileiro Modesto Carone e o alemão Ingo Schulze, parecia tonto. Modesto Carone tentou improvisar uma pergunta para Schulze que ninguém entendeu. Restou ao público ouvir o alemão narrar suas experiências de escritor nascido na Alemanha Comunista, testemunha da queda do Muro de Berlim.
Uma das pérolas da esculhambação foi proporcionada por Carlos Augusto Calil, mediador da mesa que reuniu Schulze, Carone e Naves. “Formas breves”, definiu ele, “são aqueles textos curtos, ideais para quem não tem tempo a perder com literatura e abre brechas no seu tempo para leituras rápidas.” Sem comentários...
Não foi o único caso de mediador que tentou aparecer mais do que os palestrantes. Manuel da Costa Pinto chegou a ouvir protestos do público, na mesa que teve os italianos Alessandro Baricco e Contardo Calligaris. Ángel Gurria-Quintana por várias vezes tentou impedir o colombiano Fernando Vallejo de disparar sua verve polêmica, na mesa que promoveu seu encontro com o holandês Cees Noteboom.
A sexta edição da Flip contou com novo diretor de programação, Flávio Moura, que não se deu ao trabalho de trazer qualquer poeta para a festa. Literatura, para ele, parece ser apenas ficção. Houve muita badalação, elogios, aquelas coisas. Representantes das principais editoras brasileiras estavam lá, talvez para conferir se os nomes que indicaram participaram de fato. Era o caso da Companhia das Letras e da Cosac-Naify, entre os patrocinadores da festa. Assim como a Folha de S. Paulo, cujos colunistas, cada um mais chato que o outro, ocuparam várias mesas.
Mas a Flip não frustrou o público. O crítico e ensaísta Roberto Schwarckz fez a abertura da festa com uma brilhante conferência sobre o homenageado deste ano, Machado de Assis. Ele mostrou que a obra do escritor nada tem de conservadora. Ao contrário, Machado era um crítico da sociedade de seu tempo, que tentava convertê-lo em seu aliado, e somente após a descoberta de sua obra por estudiosos estrangeiros ele pôde ser melhor compreendido em sua terra.
A psicanalista francesa Elizabeth Roudinesco fez uma interessante palestra sobre a perversão, com base em livro publicado recentemente, que aborda o comportamento doentio de personagens clássicos da literatura, como Dorian Grey, do livro de Oscar Wilde. O escritor colombiano Fernando Vallejo, polêmico e irônico, previu que a palavra “fome” será banida dos dicionários brasileiros pelo “seu presidente, gordinho e contente” e distribuiu farpas a suas costumeiras vítimas – o papa, a Colômbia, etc, etc. O holandês Cees Noteboom falou de suas viagens ao redor do mundo, de onde retira a riqueza de seus personagens.
Houve outros autores dignos de nota, mas também é preciso falar do casario de Paraty, da paisagem, da Serra do Mar, de sua gente simpática, do Teatro de Bonecos, do Armazém da Cachaça, do Bombom da Maga, do restaurante Banana da Terra e seus pratos feitos com esmero, da moqueca vegetariana do Arpoador e do restaurante Grão da Terra e sua deliciosa cozinha vegetariana, grande descoberta. E dos passeios às praias do Sono e de Trindade. A Flip foi uma experiência proveitosa. Paraty é sempre um convite à volta.
Um comentário:
Alexandre Marino,
Já tinha ouvido falar da "esculhambação" a que você menciona.
Realmente é uma pena. Eu, que ainda não tive a oportunidade de ir conferir a FLIP, cada vez que ouço sobre como as coisas funcionam, fico com menos vontade de ir lá.
Mas a propaganda das coisas boas de Paraty é um convite que entusiasma...a conhecer a cidade.
AL-Braços
AL-Chaer
Postar um comentário